Apesar de afirmações de diversos veículos de imprensa no Brasil e no mundo, a Santa Sé não alterou as regras anteriores sobre o assunto.
A polêmica aconteceu na última semana, após a divulgação de um documento da Conferência Episcopale Italiana (CEI).
A publicação afirma que “processo de formação, ao se referir a tendências homossexuais, é importante não limitar o discernimento a esse único aspecto, mas, assim como para cada candidato, compreender seu significado no contexto geral da personalidade do jovem. Isso permitirá que ele se conheça e integre os objetivos de sua vocação humana e presbiteral, alcançando uma harmonia geral”.
A instituição italiana é equivalente à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Leia o documento completo (em italiano).
A Santa Sé não se manifestou sobre o assunto. A orientação é apenas para bispos italianos e começou a valer a partir do dia 9 de janeiro de 2025 em todas as dioceses do país. As diretrizes serão testadas por três anos.
Mesmo assim, foi celebrada por ativistas do acolhimento LGBT e amplamente compartilhada por veículos da grande imprensa.
O jesuíta James Martin, líder da organização ativista Outreach, de acolhimento de LGBTs na Igreja, comemorou a suposta nova regra:
“Esta é a primeira vez que vejo em um documento aprovado pelo Vaticano que sugere que o discernimento pela entrada de um homem gay no seminário não pode ser determinado simplesmente por sua orientação sexual”, disse o reverendo James Martin, religioso de Nova York que defende uma igreja mais acolhedora para os católicos gays.”
E completou:
“A minha leitura disto — e é apenas a minha leitura -- é que se um homem gay é capaz de liderar uma vida casta e celibatária emocionalmente saudável, ele pode ser considerado para admissão ao seminário”.
A interpretação do padre Martin foi semelhante ao que foi noticiado pela mídia do Brasil e do mundo.
Uma reportagem da CNN Brasil afirmou que “o Vaticano aprovou diretrizes que permitem a homens gays se tornarem padres”. Segundo a matéria, [as novas regras] seriam “um ajuste inesperado à forma como a Igreja Católica global considera possíveis futuros padres”.
O Estadão publicou que, “de acordo com as novas orientações, os diretores de seminários devem considerar a orientação sexual como apenas um aspecto da personalidade de um candidato.”
A reportagem da Reuters afirmou que “embora o Vaticano não tenha proibido explicitamente homens gays de ingressarem no sacerdócio no passado, uma instrução anterior de 2016 dizia que os seminários não podem admitir homens com "tendências homossexuais profundamente arraigadas".
No entanto, as notícias apresentam erros conceituais. O professor de advogado canônico e civil Emanuel da Costa Júnior que explica a diretriz não é regra da Igreja e só vale na Itália:
“É uma orientação, não uma lei, ou seja, os bispos a seguem se quiserem”.
Ressalta também que a Santa Sé não se manifestou sobre a nova regulamentação e nem deve fazê-lo:
“Não é costume que se manifestem oficialmente em casos assim”, enfatiza.
O documento é válido apenas na Itália e visa garantir que todos formadores entendam corretamente as orientações estabelecidas pela Ratio Fundamentalis Institutionis Sacerdotalis.
Naquela época, o papa Bento XVI afirmou que aqueles com “tendências homossexuais profundamente arraigadas” não devem usar o seminário como uma “fuga para suas tentações”.
Esse entendimento foi reforçado em 2016 e até hoje é usado como um guia para os bispos na admissão de candidatos a padres, ao contrário do que foi noticiado.
Ao publicar a nova diretriz, a CEI esclareceu como os bispos italianos devem agir quando identificam tendências homossexuais em jovens que pretendem ingressar nos seminários. O trecho que especifica isso é o parágrafo 44, que afirma:
"O processo de formação, ao se referir a tendências homossexuais, é importante não limitar o discernimento a esse único aspecto, mas, assim como para cada candidato, compreender seu significado no contexto geral da personalidade do jovem. Isso permitirá que ele se conheça e integre os objetivos de sua vocação humana e presbiteral, alcançando uma harmonia geral”.
O documento da CEI visa eliminar más interpretações da Ratio Fundamentalis Institutionis Sacerdotalis, documento promulgado por Bento XVI em 2005 e ratificado em 2016.
Na prática, apenas o fato de um candidato afirmar sua tendência homossexual não é suficiente para exclui-lo do processo de formação para padre na Itália.
Em casos assim, é preciso que os formadores discutam junto com psicólogos se essa característica poderá impactar o ministério deles caso sejam ordenados.
Leia o documento completo (em italiano).
O jornalista Alam Carrion esclarece que o texto da CEI está totalmente de acordo com o magistério da Igreja de 2005:
“A única questão que o texto traz é que a admissão do candidato não deve ser vista unicamente do ponto de vista afetivo, ou seja, as normas continuam as mesmas. Aquele que se candidata ao sacerdócio precisa entender a castidade como um todo e compreender o celibato faz parte de sua vocação e não entender o sacerdócio como uma fuga das suas tentações”.
Isso já estava escrito na orientação de 2016, mas a CEI quis deixá-la ainda mais clara.
Alam Carrion explicou que as orientações da Igreja Católica permanecem as mesmas de 2016. Foto: reprodução Instagram.
O jornalista também afirma:
“Cuidado com as notícias que você compartilha e para não se deixar levar por influenciadores que quando lhes convém utilizam Fake News contra a Igreja Católica”.
A polêmica em torno desse caso reforça o cuidado que é preciso ter na hora de escolher onde se informar. Grandes veículos de mídia noticiaram esse fato como sendo algo novo e de uma forma tendenciosa.
Em sua busca pela verdade, a Brasil Paralelo decidiu entrar então no mundo do jornalismo. Agora, o leitor tem a oportunidade de receber todas as manhãs as informações do Brasil e do mundo com uma curadoria focada nos fatos.
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Em 2010, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) orientou os bispos do país a cumprirem a Ratio Fundamentalis Institutionis Sacerdotalis de uma forma parecida à da diretriz italiana de 2025.
Na época, o então presidente da CNBB, dom Geraldo Lyrio Rocha, disse que os gays não podem ser padres caso não se sintam capazes de assumir o celibato e a castidade.
Ao encerrar a 48ª Assembleia Geral da CNBB, disse:
“A posição da CNBB não deve ser interpretada como discriminatória às pessoas que trazem características homossexuais. A Igreja tem o direito de estabelecer critérios para a formação de sacerdotes. O celibato deve ser adotado plenamente”.
A Brasil Paralelo tentou entrar em contato com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e com a Nunciatura Apostólica para entender melhor como são as diretrizes no Brasil, mas até o fechamento desta reportagem não obteve resposta. O espaço segue aberto para a Conferência.
Em maio do ano passado, o papa se viu no centro de uma polêmica por causa de um termo utilizado em uma reunião privada.
Segundo o jornal La Repubblica, Corriere e Adnkronos, em uma reunião a portas fechadas, O papa utilizou o termo “frociaggine” para se referir à presença de homossexuais em seminários. O termo é considerado pejorativo, algo que em português seria o equivalente a “viadagem”.
Segundo o jornal La Reppublica, Francisco apontou o risco de os seminaristas viverem “uma vida dupla”, comportando-se de forma inadequada a um padre quando não estivessem na função sacerdotal.
No entanto, outro sacerdote afirmou ao mesmo jornal que Francisco desconhecia o peso ofensivo da palavra.
Por outro lado, há quem pense que o papa se posicione em prol do acolhimento da comunidade gay na Igreja.
Recentemente, ele permitiu que padres abençoassem casais do mesmo sexo em casos específicos.
Em 2023, chegou a afirmar em uma entrevista à Associated Press que ser homossexual não é crime. Ressaltou, entretanto, que é pecado.
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