O embate entre Elon Musk e Alexandre de Moraes continua repercutindo pelo mundo. Depois da Casa Branca defender a liberdade de expressão nas redes sociais, agora foi a vez de um grupo de intelectuais se manifestar.
Mais de 50 representantes de entidades internacionais assinaram uma carta aberta sobre o bloqueio do X no Brasil. Eles pedem que “os defensores da democracia” fiquem atentos ao que está acontecendo no país.
O documento foi divulgado na última terça, 17, e afirma que “a soberania digital do Brasil está sob ameaça”. Segundo eles, as big techs estão agindo como se fossem governos. Elas estariam se aproveitando da falta de regras internacionais claras para controlar o poder nos países onde operam.
Segundo a carta, o Brasil se tornou o palco de uma disputa entre quem apoia um ambiente digital democrático e as grandes empresas de tecnologia. Afirma que o bloqueio do X é uma medida do governo brasileiro para se proteger dessas ações.
Um dos trechos enfatiza:
“A briga do Brasil com Elon Musk é só mais um exemplo de como essas megacorporações tentam limitar o poder dos países de criar suas próprias regras digitais, livres do controle de empresas dos EUA”.
O documento também aponta que as atitudes de Musk favoreceriam grupos e partidos de extrema direita.
O grupo defendem que a Suprema Corte está apenas exigindo que as empresas se responsabilizem por seus modelos de negócio. Acreditam que as plataformas permitem a divulgação de violência e desigualdade e devem ser cobradas por isso.
Também chama quem apoia Musk de “extrema direita” que usa a liberdade de expressão como desculpa para “discurso de ódio”.
A carta foi assinada por economistas, filósofos e professores universitários. Entre os brasileiros que apoiam a iniciativa estão professores de instituições como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Universidade Federal do ABC (UFABC).
Enfatiza ainda que as Big Tech se aproveitam da falta de uma regulamentação internacional sobre o assunto para fazer o que quiser.
O grupo reitera seu apoio às ações de Moraes e incentiva o Brasil a "denunciar qualquer pressão que ameace sua soberania digital".
A carta termina com um apelo para que a ONU estabeleça regras internacionais que garantam “a priorização das pessoas em vez dos lucros das empresas”.
Leia o texto na íntegra:
"Contra o Ataque das Big Tech às Soberanias Digitais
Nós, os signatários, desejamos expressar nossa profunda preocupação em relação aos ataques em curso das empresas Big Tech e seus aliados à soberania digital do Brasil. A disputa do Brasil com Elon Musk é apenas o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade de nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos EUA.
No final de agosto, o Supremo Tribunal Brasileiro baniu o X do ciberespaço brasileiro por não cumprir decisões judiciais, exigindo a suspensão de contas que incitaram extremistas da extrema direita a participar de tumultos e ocupar as sedes do Legislativo, Judiciário e Executivo em 8 de janeiro de 2023. Posteriormente, o presidente Lula da Silva deixou claro a intenção do governo brasileiro de buscar independência digital: reduzir a dependência do país de entidades estrangeiras para dados, capacidades de IA e infraestrutura digital e promover o desenvolvimento de ecossistemas tecnológicos locais.
De acordo com esses objetivos, o Estado brasileiro também pretende forçar as empresas de big tech a pagar impostos justos, cumprir as leis locais e ser responsabilizadas pelas externalidades sociais de seus modelos de negócios, que frequentemente promovem violência e desigualdade.
Esses esforços têm sido alvo de ataques do proprietário da X e dos líderes de extrema direita, que reclamam sobre democracia e liberdade de expressão. Mas justamente porque o espaço digital carece de acordos regulatórios internacionais e democraticamente decididos, as grandes empresas de tecnologia operam como governantes, determinando o que deve ser moderado e promovido em suas plataformas.
Além disso, o X e outras empresas começaram a se organizar, juntamente com seus aliados dentro e fora do país, para minar iniciativas que visam a autonomia tecnológica do Brasil. Mais do que advertir o Brasil, suas ações enviam uma mensagem preocupante para o mundo: que países democráticos que buscam independência da dominação das big techs correm o risco de ter suas democracias perturbadas, com algumas big techs apoiando movimentos e partidos de extrema direita.
O caso brasileiro se tornou a principal frente no conflito global em evolução entre as grandes corporações de tecnologia e aqueles que buscam construir um espaço digital democrático e centrado nas pessoas, com foco no desenvolvimento social e econômico.
As empresas de tecnologia não apenas controlam o mundo digital, mas também fazem lobby e operam contra a capacidade do setor público de criar e manter uma agenda digital independente baseada em valores, necessidades e aspirações locais. Quando seus interesses financeiros estão em jogo, elas trabalham de bom grado com governos autoritários. O que precisamos é de espaço digital suficiente para que os Estados possam direcionar as tecnologias colocando as pessoas e o planeta à frente dos lucros privados ou do controle unilateral do Estado.
Todos aqueles que defendem valores democráticos devem apoiar o Brasil em sua busca pela soberania digital. Exigimos que as big techs cessem suas tentativas de sabotar as iniciativas do Brasil voltadas para a construção de capacidades independentes em inteligência artificial, infraestrutura pública digital, gestão de dados e tecnologia em nuvem. Esses ataques minam não apenas os direitos dos cidadãos brasileiros, mas também as aspirações mais amplas de cada nação democrática de alcançar a soberania tecnológica.
Também pedimos ao governo do Brasil que seja firme na implementação de sua agenda digital e denuncie as pressões contra ela. O sistema da ONU e os governos ao redor do mundo devem apoiar esses esforços. Este é um momento crucial para o mundo. Uma abordagem independente para recuperar a soberania digital e o controle sobre nossa esfera digital pública não pode esperar. Também há uma necessidade urgente de desenvolver, dentro do quadro da ONU, os princípios básicos de regulação transnacional para acessar e usar serviços digitais, promovendo ecossistemas digitais que coloquem as pessoas e o planeta à frente dos lucros, para que esse campo de provas das Big Tech não se torne prática comum em outros territórios."
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