Cientista político, com mais de 24 anos de experiência na formulação e gestão de políticas de controle do crime e da economia ilícita, para o setor público e privado, no Brasil e no exterior.
A segurança pública se tornou definitivamente o tema de maior preocupação dos brasileiros.
Primeiro lugar em diversas pesquisas e sondagens, seja para as eleições municipais ou para as eleições gerais de 2026.
Em consequência, os atuais chefes dos executivos municipal, estadual e federal se apressam em mostrar resultados, bem como os candidatos em apresentar propostas na área.
Mas, enfim, qual é a responsabilidade de prefeitos, governadores, presidentes e parlamentares na segurança pública?
Pretendo ajudar a responder essa questão com uma série de artigos para ajudar você, leitor-eleitor, a avaliar políticas, propostas e tomar suas decisões.
A Constituição Federal define a segurança pública no artigo 144 como:
"dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos".
Em seguida, passa a descrever as polícias e suas competências.
Como a definição é mínima e generalista (preservação da ordem pública e incolumidade das pessoas e do patrimônio), a base do sistema de segurança pública é formada por órgãos que possuem também competências generalistas: as Polícias Militares, que realizam a polícia ostensiva e a preservação da ordem; a Polícia Civil, que realiza a polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares e as de competência da União; e mais recentemente a Polícia Penal, que exerce a segurança dos estabelecimentos penais.
Portanto, pelo desenho constitucional, a segurança pública é uma atribuição principalmente dos estados (e do Distrito Federal), pois é o governador o chefe das principais polícias.
É dele a responsabilidade por manter um serviço de emergências policiais, o 190 no Brasil, da mesma forma que o 911 nos EUA (municipal) e 112 na Europa (nacional/federal, na maioria dos países).
Também é dele a competência pela investigação de homicídios, estupros, roubos de veículos e residências, por exemplo, o que seria nos EUA uma atribuição principalmente municipal e na Europa, principalmente de um órgão nacional.
E ao governo federal e municípios, o que compete no Brasil? Tanto ao governo federal quanto aos municípios cabem partes específicas das atribuições de "preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio". São atribuições condicionadas a tipos de crimes ou contextos específicos.
Ao governo federal, através da Polícia Federal, cabe a investigação de crimes contra a ordem política e social ou contra a União, crimes com repercussão interestadual/internacional, o tráfico internacional de drogas, o contrabando e o descaminho; e através da Polícia Rodoviária Federal, o patrulhamento das rodovias federais.
Portanto, reprimir a entrada/saída de cocaína, armas ilegais, o cigarro contrabandeado e o tráfico de pessoas estão entre as atribuições do governo federal.
Há ainda partes do país em que o governo federal é praticamente o "generalista" e as polícias estaduais, as complementares.
Trata-se das áreas de reservas indígenas e ambientais, das universidades federais, e principalmente, da faixa de fronteira (seca e molhada) e dos entroncamentos aeroportuários de entrada e saída do país.
Nesses locais, o governo federal exerce tanto a polícia judiciária (investigativa), quanto ostensiva, através da Polícia Federal, e de órgãos que possuem competência de polícia administrativa (ostensiva e fiscalizatória), como a Receita Federal, o IBAMA e a PRF.
Aos governos municipais, através das suas Guardas Municipais e órgãos de fiscalização de trânsito, cabe a proteção de bens, serviços e instalações dos municípios, garantir a ocupação e uso regular/legal do espaço público, as chamadas "posturas municipais", gerenciar o trânsito e, em interpretações recentes, a proteção dos próprios munícipes.
Os municípios têm grande importância no controle da desordem física e social, como o barulho excessivo, bares irregulares, terrenos baldios e pichações.
Preditores da formação de cracolândias, pancadões ou locais dominados pelo varejo de produtos ilícitos, decorrentes de contrabando, falsificação, produtos roubados ou drogas.
Há forte tendência de utilizar as Guardas Municipais no policiamento ostensivo, o que tem suscitado debate sobre a base legal para esse emprego.
No âmbito dos legislativos, temos um grande problema: a legislação penal, o marco legal para atuação das polícias nos três níveis (federal, estadual e municipal), é toda de competência federal.
Ou seja, um governador não pode, por exemplo, discutir com sua Assembleia Legislativa a mudança da execução de pena de um criminoso violento ou criar um tipo penal sobre um problema que afete apenas ou em maior intensidade a população do seu estado.
Ele precisa levar isso para o Congresso Nacional e "esperar" que o problema vitimize mais pessoas em todo o país para que tenha legitimidade para ser priorizado no Congresso.
Ao contrário da legislação de trânsito e mesmo de dispositivos de controle de desordem, que são concorrentes entre Congresso Nacional, assembleias e câmaras municipais.
Portanto, cabe aos senadores e deputados federais estabelecerem o marco legal penal e processual penal, que inclui a execução da pena (o maior problema da legislação), e aos deputados estaduais e vereadores, legislar sobre normas de trânsito e controle de desordem (como impor multas e fechar comércios irregulares).
Enfim, agora que as responsabilidades e as competências foram apresentadas, iremos, nos próximos artigos, discutir como essas responsabilidades podem se transformar em políticas públicas que nos protejam efetivamente a nós e a nossa família. Até lá!