Dr. Marcello Danucalov

Dr. Marcello Danucalov é doutor em ciências (psicobiologia); Mestre em farmacologia; Filósofo Clínico Integral e Orientador Filosófico Familiar.

OPINIÂO

A ordem temporal vai salvar a sua vida

Se você não consegue organizar a sua vida em uma rígida sequência de ações planejadas, será mais um que morrerá na mediocridade e terá a sua memória apagada da história.

Dr. Marcello Danucalov

Talvez você nem ao menos se recorde, mas houve um momento em sua vida em que você teve consciência de que estava imerso no tempo.

Sim, este momento existiu. Provavelmente a inserção na quarta dimensão não tenha sido plenamente percebida por você, afinal, você era somente uma criança, o que lhe impediu de filosofar sobre este que é um dos maiores mistérios da existência. 

O que é o tempo? O universo em que vivemos teve um começo? Neste caso, o que existia antes? Se não havia um universo, não havia espaço, e se não havia espaço, provavelmente, nem mesmo o tempo existia. 

Mas, sem a existência do tempo o que tomaria o seu lugar? O nada absoluto?  E quanto a eternidade, o que ela é? 

Essas são apenas algumas das profundas questões existenciais que todo homem que tenha recebido a graça do pleno amadurecimento, não se furta de fazer a si mesmo.

A percepção do tempo se dá quando, segundo o professor Olavo de Carvalho, adentramos na quarta camada da personalidade. 

O tempo é a quarta dimensão do universo e a quarta camada da nossa personalidade. A camada 4 caracteriza-se por ser um período em nossa vida onde nossos afetos, nossas emoções e nossos sentimentos começam a ser historicamente consolidados em nossa memória, ela mesma filha do tempo. 

É quando se abre para nós a história do nosso sucesso ou do nosso fracasso; é quando passamos a perceber se somos amados ou não; se somos cuidados ou não; se somos percebidos ou não. 

Personaliza-se assim um mundo emocional e o valor das coisas começa a ser julgado em função deste tempo percebido, das aspirações nutridas, dos desejos satisfeitos ou não. 

Aprofunda-se assim, a consciência do enorme abismo que existe entre a perspectiva futura e o mundo real; entre a crueza concreta da vida e a docilidade da projeção imaginativa, que arremessa para o futuro a expectativa do prazer do amanhã.

Na quarta camada tem início a tal busca da felicidade, que neste momento é definida como o encontro com as coisas prazerosas. 

Logo, não é bem a felicidade que se busca, mas as sensações agradáveis que emanam do encontro com os objetos de desejo, sejam eles quais forem. 

A inserção na camada 4 caracteriza-se por um intenso período de buscas compulsivas por autossatisfação que tem início na infância, solidifica-se na adolescência, e deveria, ao término desta, também cessar. Infelizmente não é isso que acontece com a maioria das pessoas do mundo pós-moderno, ao menos no ocidente. Mas isso é assunto para um tempo futuro. No tempo presente importa-me provocá-lo em um outro sentido.

Tudo que tem início deve também ter um fim, porém, nossa inserção na temporalidade não nos concede de imediato a certeza de nossa finitude, em outras palavras, a admissão no tecido do tempo não vem acompanhada da imediata coragem para enfrentar a certeza do nosso fim. 

Sim, o tempo passa; o tempo voa; o tempo galopa; o tempo escorre pelos dedos; e essa verdade só é plenamente percebida quando chegamos à metade de nossa vida, quando a projeção estatística dos anos futuros passa a ser progressivamente menor do que a recordação da grandeza numérica dos anos já vividos. 

Para aqueles afortunados que continuaram amadurecendo nas camadas da personalidade, é um excelente momento para acertar o leme do barco da vida, reajustar as coordenadas e decidir com segurança como serão navegadas as últimas milhas que restam. 

É neste momento que o valor do tempo atinge o seu ápice. Um homem que tem seu rosto marcado pelas rugas esculpidas pelo tempo, aprende a amar o escultor com muito mais intensidade. 

Eu sou um deles. Tenho cinquenta e sete anos e ontem, eu disse ontem, eu era um menino. Desperdiçar uma única hora do dia para mim é um sacrilégio, pois o tempo há muito já se configurou em minha estrutura de pensamento como uma dimensão sagrada. 

Eu definitivamente não tenho mais tempo a perder. Meu tempo é caro; meu tempo é curto; meu tempo é santo; meu tempo é o que de melhor eu posso dar àqueles que amo. 

Tempo dado é tempo perdido para sempre, assim como o tempo guardado também o é, por isso, há que se escolher muito bem com quem vamos passar o nosso tempo e a quem vamos presenteá-lo com sua etérea presença.

Dito isso, posso dividir com você uma das maiores misérias da vida: O desperdício do abençoado tempo. 

Jogamos a graça do relógio divino no lixo quando procrastinamos aquilo que era nosso dever fazer agora; quando adiamos para as calendas gregas as ações prometidas para hoje; quando trocamos nosso propósito de vida por curtidas estéreis no instagram; quando nos iludimos com desculpas tranquilizadoras que justificam nossa irresponsabilidade com aqueles com quem nos comprometemos; quando mentimos para nós mesmos negando nossa finitude e fugindo covardemente dos pensamentos sobre a possibilidade de morrermos ainda hoje; quando olhamos para o nossos pais e impedimos assustados aqueles pensamentos intrusivos que os colocam deitados em um caixão à nossa frente; quando, com trinta e poucos anos da cara, passamos duas horas por dia jogando vídeo game com outro marmanjo irresponsável qualquer; quando defendemos abertamente a criança que mora dentro de nós quando já contabilizamos meio século de existência etc. 

Se você soubesse que só lhe restasse dois anos de vida, o que você deixaria de fazer, e o que você faria hoje, agora, imediatamente? E como você sabe se vai ou não morrer daqui a dois anos? 

Uma das maiores virtudes que um homem pode desenvolver na vida é a virtude da ordem temporal. 

Cada coisa tem um quando e as coisas precisam ser realizadas imediatamente no quando das coisas:

Há um tempo para cada coisa debaixo do sol, tempo de plantar, de colher, de nascer, de viver e de morrer – Eclesiastes 3:1.

Como psicoterapeuta tenho visto nos últimos anos vidas absolutamente devastadas pela desordem temporal, e tenho tido a grata satisfação de ajudar centenas de pessoas a colocar ordem onde antes só havia caos, desordem e desespero, ou ainda, uma total anodinia quanto a isso. 

O universo é regido por leis estritas e precisas. A química, a biologia, a fisiologia e a física obedecem a um sequenciamento temporal rigoroso na explicitação dos seus respectivos fenômenos. 

A água ferve no exato tempo em que atinge cem graus Celsius, nem um segundo antes, nem um segundo depois. 

Um homem que não tenha em sua casa uma agenda material, fixa, visível, onde delimite e siga com extremo rigor o período do dia em que irá orar; jejuar; surfar; treinar; amar; praticar caridade; estudar; descansar; ler; caminhar etc., é um homem fadado ao fracasso, morrerá como um medíocre e terá sua memória apagada da história.

Quanto a isso podemos lembrar de uma linda passagem do livro Psicologia do caráter, de Rudolf Allers:

“Um homem não é apenas o que é, mas também o que pode – e deve – ser. Esquecer-se das potencialidades jazentes na personalidade enquanto nota distintiva da essência humana é, de alguma maneira, reduzir a análise da alma de uma pessoa aos vícios e imperfeições que ela atualiza.”

E você, como tem gerido seu tempo? Acredita que morrerá como é ou como deveria ter sido? O que pensa sobre isso?

Dr. Marcello Danucalov

Doutor em Ciências (psicobiologia);

Mestre em Farmacologia;

Filósofo Clínico Integral e Orientador Filosófico Familiar.