Dr. Marcello Danucalov é doutor em ciências (psicobiologia); Mestre em farmacologia; Filósofo Clínico Integral e Orientador Filosófico Familiar.
Uma das palavras mais proferidas na conturbada contemporaneidade pós-moderna é desconstrução.
É possível ouvi-la nas escolas, nas universidades, na literatura, na pobre filosofia contemporânea, nas novelas, nas músicas, nas mídias etc.
Com sua onipresença na confusa polifonia discursiva a que somos submetidos diariamente, incute-se no imaginário da maioria das pessoas a crença de que o novo é necessariamente melhor do que o velho, e que aquilo que passou já não nos serve mais.
Desconstrói-se o passado, as narrativas, os contos de fadas, a história, a linguagem, os significados, a masculinidade, a feminilidade, o sexo, a biologia, a ciência, os cromossomos, a religião, a fé, a família, os valores, as virtudes, entre tantas outras coisas.
Com a desconstrução vem a falta de referências minimamente sólidas, e sem elas surge a desconfiança, a ansiedade, o medo, e tudo isso da origem a um dos piores males da pós-modernidade: o caos, a desordem, a confusão.
A desordem é, sem dúvida alguma, o maior problema da população. Ela é o pano de fundo de quase todos os problemas que eu trato diariamente em meu consultório.
A desordem subjaz aos conflitos matrimoniais; aos problemas relacionados à educação dos filhos; ao estresse e ao burnout; ao vício em pornografia e/ou vício em drogas; à falta de propósito e sentido da vida etc.
A desordem acomete homens e mulheres; crianças e adolescentes; ateus e crentes; analfabetos e doutores; heteros, gays, lésbicas e simpatizantes, e, acredite você ou não, a desordem incide até mesmo naqueles que se julgam conservadores e virtuosos.
Minha experiência clínica corrobora – se é que isso é necessário – com toda sabedoria aristotélica e tomista, que tanto insistiu na relação entre vida ordenada e atingimento da excelência humana, e é incrível como a desordem mais básica, ou seja, a desordem da vida material, pode destruir uma vida inteira, contaminando os elementos psíquicos mais sutis, gerando dores e sofrimentos que poderiam ter sido facilmente evitados se alguns hábitos fossem desenvolvidos desde a infância.
Os antigos gregos eram muito mais sábios do que nós e pela pura contemplação, já tinham intuído a ordem cósmica.
A ética grega, ou seja, a maneira sugerida para se viver uma boa vida, passava pela reprodução da ordem cósmica na vida humana.
Se cada coisa tem uma função e um lugar específicos no universo; se cada coisa tem um onde, é neste onde que ela deve ser encontrada.
Assim como o sol, a lua, as montanhas, os rios, os peixes e os pássaros tem o seu lugar, assim também deve ser com as coisas concretas que fazem parte de nosso dia: sapato é na sapateira; fruta na fruteira; toalha molhada é no varal; livro é na estante; louça é no armário da cozinha e por aí vai.
Se sujou lave; se bagunçou arrume; se abriu feche; se esvaziou encha; se usou guarde; se acabou reponha, e tudo, preferencialmente, imediatamente.
Essa é a primeira ordem a ser ensinada a uma criança, mas, infelizmente, milhões de idosos ainda não a aprenderam.
Todo indivíduo que vive em um lugar desordenado materialmente, invariavelmente desordenará outro aspecto da sua realidade: o tempo.
Quem vive no caos material acaba tendo dificuldades para encontrar suas chaves, guarda-chuvas, documentos, meias, cuecas etc.
Por não cuidar do carro pode ser deixado na mão devido a uma pane qualquer. Por não manter sua cozinha em ordem pode ser surpreendido por um vazamento de gás.
Tudo isso pode atrasá-lo e comprometer sua agenda – partindo da delirante hipótese de que a tenha.
A desordem material produz uma desordem temporal. Mas, a coisa ainda pode piorar um pouco mais.
Uma vez atrasado para algum compromisso importante é muito provável que o bagunceiro em questão seja acometido por toda sorte de emoções negativas, tais como: nervosismo; ansiedade; angústia; raiva; vergonha etc.
E lá se foi mais uma ordem para o beleléu, a ordem dos afetos. A partir de agora ficará cada vez mais difícil conviver com este ser, pois histrionismos e chiliques passarão a ser a regra e não a exceção na vida deste bagunceiro costumaz.
Mas, ainda não acabou. Como as paixões tendem a obscurecer o intelecto, e como as emoções são um tipo de paixão, podemos esperar que a desordem material, que gera a desordem temporal, que produz a desordem afetiva, torne caótica a ordem intelectiva, emburrecendo momentaneamente o referido desordeiro que, uma vez burro, será totalmente incapaz de inserir-se na realidade e encontrar a verdade, seja ela concreta ou metafísica.
A pobre alma ficará incapacitada para discernir o que é feio, daquilo que é bonito; o que é errado, daquilo que é certo; o que é elevado, daquilo que é baixo; o que é sagrado, daquilo que é profano.
Por fim, animalizar-se-á transformando-se em mais um Gollum pós-moderno, eleitor de mentiras, irresponsável, compondo sua família unicamente por plantas e animais, apreciador das “ervas finas” que perturbam o senso da realidade e, como um bicho, escravo de seus desejos que o mantém na selva caótica da sua mente e da sua vida.
Certo mesmo está o Jordan Peterson: “Se você quer mudar o mundo, comece arrumando sua cama”.
Dr. Marcello Danucalov
Doutor em Ciências (psicobiologia);
Mestre em Farmacologia;
Filósofo Clínico Integral e Orientador Filosófico Familiar.