Na manhã do dia 16 de novembro daquele ano, os periódicos brasileiros noticiaram um dos eventos mais marcantes da história do Brasil. No dia anterior, tropas do exército foram às ruas e derrubaram a monarquia.
O jornal O Paiz, na edição datada do dia 16 de novembro de 1889, noticiou o assunto da seguinte forma:
Transcrição: “O povo, o exército e a armada nacional, em perfeita comunhão de sentimentos com os nossos concidadãos residentes nas províncias, acabam de decretar a deposição da dinastia imperial e, consequentemente, a extinção do governo monárquico”.
Pelo texto acima, percebe-se não se tratar de um jornal imparcial. A redação de O Paiz era liderada por um importante personagem da história brasileira, Quintino Bocaiúva. O texto de seu jornal é uma reprodução do texto oficial da “proclamação”.
Bocaiúva foi um dos articuladores do golpe contra a monarquia. Após a deposição do regime, foi instituído um governo provisório liderado pelo presidente Marechal Deodoro da Fonseca em que ele fazia parte como ministro das relações exteriores.
Transcrição: “O governo provisório, instalado ontem, compõe-se dos cidadãos Quintino Bocayuva, marechal Deodoro da Fonseca, e tenente-coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães”.
Veja como a nota, reproduzida pelo jornal, descreveu o governo provisório:
Transcrição: “O governo provisório, simples agente temporário da soberania nacional é o governo da paz, da liberdade, da fraternidade e da ordem. No uso das atribuições e faculdades extraordinárias de que se acha investido para a defesa da integridade da pátria e da ordem pública, o governo provisório, por todos os meios ao seu alcance, promete e garante a todos os habitante do Brasil, nacionais e estrangeiros, a segurança da vida e da propriedade, o respeito aos direitos individuais e políticos, salvas, quanto a estes, as limitações exigidas pelo bem da pátria e pela legítima defesa do governo proclamado pelo povo, pelo exército, pela armada nacional.”
Um fato histórico sobre a queda da monarquia é que o Brasil foi pego de surpresa. Fora do núcleo que organizava o golpe, a tensão não era entendida como um ataque ao monarca, mas sim ao governo.
No Segundo Reinado foi instituída a figura do presidente do Conselho de Ministros. Para fins comparativos, esse cargo era equivalente ao primeiro-ministro da Inglaterra.
Na concepção da época, quem governava era o primeiro-ministro, enquanto o imperador ocupava uma função entendida como distanciada da política partidária.
O golpe que derrubou a monarquia se iniciou contra o Visconde de Ouro Preto que à época era o Presidente do Conselho de Ministros. Como reportou o Jornal do Commercio na edição do dia 16 de novembro:
Transcrição: "A consequência imediata destes fatos foi a retirada do ministério de 07 de junho, presidido pelo Sr. Visconde de Ouro Preto, que teve de ceder à intimação feita pelo Sr. marechal Deodoro da Fonseca, que assumiu a direção do movimento militar.”
Em outro trecho da matéria, O Jornal do Commercio evidenciou a gravidade dos acontecimentos, clamou por calma para que não acontecesse violência. Também recapitulou tudo o que ocorreu no dia anterior, organizando os fatos por hora.
Conta o jornal que, às 15h, o povo chegou à Câmara do Rio de Janeiro, onde o então vereador, José do Patrocínio, fez um discurso em que proclamava a República, o que surpreendeu o imperador que estava em Petrópolis.
Transcrição: “Logo que recebeu, em Petrópolis, o telegrama em que o ministério pedia sua exoneração, o imperador resolveu vir para a corte, tomando a estrada de ferro do norte. Chegando a S. Francisco Xavier dirigiu-se em carro para o paço da cidade, onde já se achavam a Sra. Condessa d’Eu e seu esposo.”
O casal citado no trecho é a princesa Isabel e o Conde d’Eu. Agora no Paço, Pedro II convocou importantes políticos para tentar encontrar uma solução. Sua pretensão era substituir o Visconde de Ouro Preto por José Antônio Saraiva, que esteve no prédio às 21h e também às 23h20.
Dom Pedro II, de certa forma, parecia não compreender por completo a situação. Não se tratava mais da queda de um governo, mas da queda da monarquia.
Como os acontecimentos narrados ocorreram na então capital do país, lá os fatos repercutiram mais rápido. Nas outras províncias, como eram chamados os estados, a notícia de que a monarquia estava em cheque demorou mais a chegar.
Segundo o artigo A relação entre a imprensa soteropolitana com o golpe de 1889, ao chegar a novidade na Bahia, o presidente de província, Augusto Guimarães, colocou-se de prontidão para defender o imperador e resistir às ordens do novo governo:
“A Câmara Municipal da Bahia protesta contra a ditadura militar que, sob o nome de Governo Provisório, estabeleceu-se na corte, e afirma sua completa adesão às instituições e ao Imperador. A província da Bahia não adere ao movimento ilegal e tumultuário imposto pela força, e, ao que parece, aceito pelo terror. Pede que communique todas folhas” (p.3)
“Comunique todas as folhas” é um pedido para que avise a sua posição a todos os jornais.
Em Salvador, existiam jornais de diferentes visões ideológicas. Alguns se identificavam com a república, como A Gazeta da Tarde, O Diabo e a Voz da Pátria e outros com a monarquia, como O Monitor Catholico, Diário da Bahia e Gazeta da Bahia.
Na primeira edição do jornal Diário da Bahia que consta no acervo da Biblioteca Nacional, o redator se mostrou frustrado com o apoio da população do Rio de Janeiro ao exército.
Aquilo que inicialmente parecia um movimento de caráter exclusivamente militar, relevou-se diferente à medida que outras notícias foram sendo divulgadas:
Transcrição: “Não era exclusivamente uma sedição militar, o povo da capital do império fraternizou com a força armada, de vários pontos chegam notícias de adesões sempre crescentes. Não há sinais de revolta contra o governo recentemente estabelecido, em algumas províncias inaugurou-se o novo regime sem que descontentamentos e reações mostrassem que o povo prefere as instituições que o governo provisório aboliu. Era de nosso dever estar ao lado do povo, se este estivesse contra o exército, mas se o povo aceita espontaneamente o novo governo, não poderíamos resistir-lhe, sob pena de pretendermos encarnar o arbítrio, contra o qual estávamos dispostos a defendê-lo.”
Independentemente do Estado, a forma de noticiar variava conforme o posicionamento político do jornal. Naquele tempo, era comum que as tipografias tivessem um lado ideológico declarado e definido.
O jornal liberal O Pharol, de Minas Gerais, noticiou em sua edição de 16 de novembro como um importante acontecimento que foi recebido com grande entusiasmo pela província:
Transcrição: “Na confeitaria Azevedo, onde foram afixados os telegramas da imprensa, reuniu-se grande massa de povo, comentando os acontecimentos e correspondendo calorosamente aos vivas, que eram erguidos. Pouco depois, uma banda de música percorreu várias ruas da cidade, entoando a Marselhesa, sendo seguida de avultado número de pessoas, que saudaram entusiasticamente a República. Durante a manifestação, que se prolongou até à meia noite, foram proferidos muitos discursos.”
O pensamento republicano ganhou força ao longo do século XIX entre os chamados liberais radicais.
“O Partido Republicano foi fundado em 1870 por liberais radicais que se tinham convencido da impossibilidade de realizar as reformas que defendiam dentro do regime monárquico.”, afirmou José Murilo de Carvalho em artigo para a revista Varia História da UFMG.
Como o partido não conquistou vitórias significativas no campo eleitoral, o campo cultural e jornalístico funcionava como um refúgio para difundir suas ideias:
“Os republicanos utilizavam os mesmos meios de propaganda que os partidos monárquicos, concentrando-se em livros, panfletos, jornais e conferências públicas”, pontuou José Murilo de Carvalho no mesmo artigo.
Como consequência desse esforço para se fazer presente, havia muitos jornais e jornalistas adeptos ao republicanismo.
Importante salientar que não havia uma hegemonia nos jornais.A pluralidade de ideias transformou a imprensa em um verdadeiro campo de batalha.
Uma batalha que ora era dominada por um lado, ora por outro, até que chegou o momento em que o lado republicano triunfou.
Mas se havia um equilíbrio, o que fez essa balança pesar para um lado? Os militares. A força das tropas na rua forçou a queda da monarquia. A liderança de um general respeitado e conhecido como Deodoro da Fonseca deixou pequena a possibilidade de reação da monarquia.
Engana-se quem pensa que este acontecimento apenas fez o Brasil ter um novo regime. A bem da verdade, ele criou uma nova tradição.
Em seu artigo, Necessidade, contingência e contrafactualidade. A queda do Império reconsiderada, Christian Edward Cyril Lynch afirma:
“A execução das reformas por um golpe que impôs o projeto da minoria radical teve efeitos duradouros para a república que duraria até 1930. Ele rompeu a tradição de mudança negociada e inaugurou outra, a do golpe como meio de resolução dos conflitos.”
Um golpe militar que inaugurou uma tradição de golpes, em que, em todos eles, esteve presente o exército. Seja como autor do golpe ou contra ele, a exemplo do caso em que o exército garantiu a posse de Juscelino Kubitschek.
Entender a história do exército é essencial para conhecer o passado do Brasil. Em breve, você terá acesso ao primeiro episódio de Pátria Amada e Ultrajada. Este é o novo original que mostra o papel do exército ao longo da História do Brasil.
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