A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) anunciou, no sábado (08/05), que a licitação para a compra de arroz estrangeiro passará por uma auditoria.
Entre as empresas vencedoras da licitação constam uma pequena loja de queijos, uma locadora de veículos e uma fábrica de suco e sorvetes. O leilão realizado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) irá investir até 1,3 bilhões de reais na aquisição de 263 mil toneladas de arroz.
Procurada por veículos de imprensa para se pronunciar sobre a situação, a Conab enfatizou que só conhece empresas participantes após a finalização do leilão. Um dia depois, no dia 09/06, a entidade confirmou que realizará a auditoria da licitação, após ter sido questionada.
A oposição ao presidente Lula (PT) e o agronegócio criticaram o pregão e colocaram em dúvida seu resultado.
As quatro empresas vencedoras foram divulgadas na última quinta-feira, 6 de junho de 2024.
O órgão convocou bolsas de mercadorias para atestar que os vencedores do leilão têm plena capacidade de cumprir os contratos com o governo. Segundo o site do Banco Central, uma bolsa de mercadorias é composta por associações privadas civis que têm como objetivo garantir a transparência dos contratos entre o governo e as empresas privadas.
A ata de leilão público divulgada pela entidade mostra as empresas vencedoras foram Zafira Trading Ltda, Asr Locação de Veículos e Máquinas Ltda, Icefruit Indústria e Comércio de Alimentos Ltda e Wisley A. de Souza Ltda.
De acordo com a Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE), apenas uma das empresas vencedoras têm o comércio exterior como seu ramo de atividade principal. Esse fato despertou a atenção de políticos da oposição e da imprensa, que questionaram a capacidade das outras três empresas, cujas atividades são diferentes, de cumprir adequadamente os contratos firmados.
Um dos fatos que mais chamou a atenção foi o de que a maior cota do leilão foi arrematada por um empreendimento descrito como vendedor de leite e laticínios. Com sede no Amapá, a companhia é avaliada pelo site de vendas B2B econodata como contendo baixa assertividade em seus contratos.
Isso significa que a companhia frequentemente não cumpre prazos ou mesmo deixa de entregar o serviço contratado no prazo estabelecido pelo contrato.
A Queijo Minas, nome fantasia da Wisley A. de Souza Ltda, está ativa desde 2006 e é de propriedade de apenas uma pessoa. A empresa receberá R$736,3 milhões como pagamento pela importação e distribuição de 143,3 mil toneladas de arroz.
O segundo maior lote foi arrematado pela única empresa do grupo que está registrada como importadora. A Zafira Trading Ltda receberá R$368,9 milhões pela importação e distribuição do alimento. As demais empresas vencedoras, registradas como locadoras de veículos e indústria de alimentos, receberão R$112,5 milhões e R$98,7 milhões respectivamente.
A Asr Locação de Veículos e Máquinas Ltda, cuja principal atividade é o aluguel de equipamentos, chamou a atenção por possuir uma variedade de ramos de atuação sem correlação aparente entre si. De acordo com o Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), a empresa também atua nos setores de construção de edifícios e rodovias, obras, publicidade, desenvolvimento de programas de computador, serviços de escritório e de limpeza. Além disso, o empreendimento se apresenta como comerciante atacadista de diversas categorias, incluindo cereais.
Um grande veículo de imprensa procurou a empresa para entender melhor suas atividades. A assessoria de comunicação da ASR informou que a empresa já trabalha com licitações há mais de 10 anos, tendo vencido um leilão da CONAB no final do ano passado. Na ocasião, a empresa foi contratada para distribuir 2.011 mil sacas de milho na Bahia.
Crispiniano Espindola Wanderley, o único sócio da empresa, esteve envolvido em uma investigação de corrupção em 2007. Na época, Alberto Fraga, então secretário de Transportes do Distrito Federal, teria exigido de Wanderley o valor de R$350 mil para assinar um contrato de ônibus com a cooperativa presidida pelo empresário.
Fraga foi condenado, mas recorreu e acabou sendo inocentado. Wanderley, por sua vez, não foi investigado. Embora membros da cooperativa alegassem que o pagamento de propina foi o motivo da destituição de Wanderley da presidência da entidade, a Justiça entendeu que não havia provas suficientes para a abertura de um inquérito.
Em nota, o órgão afirmou que considera a transparência e a segurança jurídica como valores inegociáveis. A entidade reiterou que espera garantir a solidez da transação, considerada uma "grande operação".
A Conab foi criada em 1990, através da fusão entre a Companhia de Financiamento da Produção (CFP), a Companhia Brasileira de Alimentos (Cobal) e a Companhia Brasileira de Armazenamento (Cibrazem). Seu objetivo é fornecer ao governo federal informações técnicas para embasar a tomada de decisões na elaboração de políticas voltadas à agricultura.
A entidade recebeu do governo Lula a incumbência de intermediar a compra de arroz estrangeiro por parte do governo. A medida foi tomada para evitar uma possível escassez do grão, um dos principais itens do prato do brasileiro.
Cerca de 70% da produção de arroz no Brasil é feita no Rio Grande do Sul, estado que tem sido afetado por inundações desde o final de abril.
No dia 9 de maio de 2024, o governo publicou uma Medida Provisória que o autoriza a comprar até 1 milhão de toneladas do grão, com o objetivo de impedir a interrupção no fornecimento em todo o Brasil. A justificativa é o impacto da tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul na plantação, logística e distribuição de arroz. O estado é responsável por 70% do abastecimento nacional.
Na ocasião da assinatura da medida, produtores alegaram que o impacto não tinha sido tão consistente. O Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga) afirmou que 82,9% das lavouras haviam sido colhidas antes das enchentes, restando apenas cerca de 150 mil hectares.
O órgão alegou ainda que a região central do estado foi a que apresentou menor percentual de área colhida, com 62%.
O fato de as áreas mais impactadas pelas enchentes não influenciarem tanto na redução das produção de arroz foi uma das razões para o questionamento da necessidade de o governo importar os grãos, iniciativa popularmente conhecida como “Arroz Brás ".
Na época, foi questionado também o impacto da medida sobre produtores e distribuidores de arroz, sobretudo no momento em que a economia do estado precisará se reestruturar.
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