Luís Ernesto Lacombe

Jornalista com 36 anos de experiência, apresentador e autor de cinco livros, um deles best-seller. Por duas vezes, ganhou o Troféu Imprensa e o Prêmio Comunique-se.

OPINIÂO

Os Amigos do Fim de Tudo

O mundo, o Brasil, está tudo do mesmo jeito, tudo invertido. São raros os lugares, são raras as situações em que o mal é o mal, em que o bem é o bem.

Luís Ernesto Lacombe

E o pior é que em nosso país já nem se pode mais apontar a farsa, sem correr enormes riscos. Negociatas não são mais negociatas, roubalheira não é mais roubalheira... Não, pilhagem nunca houve. 

Os criminosos, no país pelo avesso, não são mais criminosos, e os inocentes de verdade passaram a ser bandidos. Tudo foi invertido, pervertido, subvertido. Fomos empurrados, sem dó nem piedade, ao colapso geral, moral, político, judicial.

Não adianta que assumam seus crimes, os bandidos reais, em confissões, delações, acordos de leniência. Pode ter carta, nota oficial para a imprensa: "Erramos... Estamos aprendendo com nossos erros, evoluindo". 

Não adianta que se juntem provas e mais provas das práticas ilegais, planilhas, que se recupere um dinheirama. Há sempre um amigo do amigo do amigo pronto para mudar o passado

Nada do que aconteceu aconteceu. Estão todos liberados; suas penas anuladas devem transformá-los em heróis, em "guerreiros do povo brasileiro", em empreendedores santificados... Mais uma vez, os "campeões nacionais", de banho tomado e novo nome, para que ninguém queira puxar pela memória. A ordem é não ter memória.

E o juiz que já foi, um dia, a esperança desse país entrega os pontos de vez. Já não tem bandeiras, é morno, é manso. Aceita o que pareceu combater em outros tempos... Permite que o país não tenha pretérito, não lute no presente e, portanto, abra mão do futuro. 

Elogia, tentando uma especificidade que não cabe, a "independência do Judiciário". Em relação a quem? Em relação a quê? Tristes tempos estes em que resolveram agir e permitir que se aja independentemente das leis, do mundo real. 

Somos a mentira, o embuste, a trapaça, a tramoia, o golpe, a cilada. Somos todos os substantivos e adjetivos detestáveis que foram transformados em coisa boa.

Há rodas de samba para o condenado a mais de 400 anos de prisão, ou uma cadeira de rodas quando ele achar conveniente. E não venham falar em escárnio. Esqueçam o passado

Lembrem-se de que o que é ruim passa a ser bom, o que é profano passa a ser sagrado. Dependendo da pessoa em questão, é permitido comemorar desastre aéreo com mais de 300 mortos, agradecer à "natureza por ter criado esse monstro chamado coronavírus". Dá até para ir ao Vaticano e dizer: "Malditas sejam todas as cercas, malditas todas as propriedades privadas".

Escolheram a calamidade, apoiando o que nunca deu certo, em lugar nenhum, em época nenhuma. Temos um rombo fiscal de pandemia, corruptos liberados, perseguição política, censura... Aqui e pelo mundo, santificaram também um "carniceiro", alguém que prendia, torturava e assassinava opositores. 

Como está tudo ao contrário, aquele que era temido e odiado virou um "excelente ser humano", uma "pessoa exemplar". Seus amigos ficaram tristes... Os amigos da tirania, da barbárie, do caos. Os amigos dos amigos dos amigos dos amigos do fim de tudo.