André Marsiglia, 45 anos, é advogado e professor. Especialista em liberdade de expressão, foi o primeiro advogado dos inquéritos das fake news. Mestre e Doutorando pela PUC/SP, pesquisa casos de censura no Brasil. É autor do livro “Censura por toda parte”. Escreve para a Brasil Paralelo aos sábados.
Na noite da última quarta-feira, um homem, com prováveis problemas mentais, lamentavelmente disparou explosivos contra si mesmo, em um pátio próximo ao prédio do Supremo Tribunal Federal. Se sua intenção foi fazer um atentado, importa que não o fez. Mas se nossas autoridades reagirem ao acontecimento limitando nossos direitos, sobretudo nas redes sociais, isso, sim, será um verdadeiro atentado contra a liberdade de expressão.
Do ponto de vista jurídico, a intenção do homem não é relevante. O Direito cuida apenas do que é feito, não do que se cogita fazer. Se alguém planeja um golpe de Estado, mas assalta um mercado, será julgado por assalto, não por golpe. Direito não julga fantasias, nem investiga pensamentos. Do contrário, estariam presos escritores e roteiristas de livros e séries sobre assassinatos.
Então, o caso é simples: um homem jogou explosivos em uma via pública e se matou. Como está morto, não poderá ser punido. E ponto final, certo? Errado. No Brasil, nenhuma coisa mais é simples e as questões jurídicas foram todas completamente politizadas.
No universo da política, o caso pode se tornar, em um passe de mágica, um ataque às instituições e um atentado à democracia, permitindo que o STF se arme para silenciar e regular redes, esfacelando com a liberdade de expressão. Tanto é verdade, que já estamos vendo ministros afirmarem aos microfones da imprensa que o ódio e extremismo das redes foram responsáveis pelas explosões.
Mas por que miram especialmente a liberdade de expressão nas redes sociais? Não é à toa. Como a imprensa tradicional é praticamente toda de esquerda, as redes são hoje em dia um dos maiores canais de comunicação livre do pensamento de direita. Como o desejo de censura é da esquerda e de seus aliados, o alvo é a liberdade que a direita encontra nas redes.
Por isso, as autoridades se esforçam para dizer que o extremismo é coisa das redes e da direita. Por isso, a mídia se precipita para carimbar o homem que se explodiu como patriota, bolsonarista e de direita, mesmo que ele tenha dito que desgostava tanto de Lula quanto de Bolsonaro.
O homem, que provavelmente não passava de um amalucado suicida, simboliza um mundo doente. Mas querem que ele simbolize outra coisa: a direita e as redes sociais. E, com isso, se justifiquem perseguições e silenciamentos.
É preciso estar atento para evitar que se normalize a narrativa que está sendo construída para o episódio, de tal modo que haja conforto para se atentar contra a liberdade de expressão. Se vier uma nova bomba de censura, neste momento do país, dificilmente será desarmada sem que, antes, exploda na nossa cabeça, sem que tenha impacto direto nas eleições presidenciais de 2026.