Economista com pós-graduação em mercado de capitais pela Universitat Autònoma de Barcelona. Com 17 anos de experiência no mercado financeiro, gerencia sua própria empresa de investimentos desde 2012. Também é professor de graduação no Brasil e pós-graduação na Espanha, lecionando macroeconomia. É também criador do canal "Minuto do Musa" e da BM Educa, focada em educação financeira.
O PIB brasileiro cresceu 0,9% no trimestre e surpreendeu a grande maioria das pessoas. Realmente o crescimento chamou a atenção, mas ao olharmos mais a fundo no detalhe, o crescimento é realmente sustentável? O modelo econômico desenhado é perene e de longo prazo ou mais um voo de galinha do Brasil?
Colocarei aqui os pontos e deixo a conclusão final com cada um de vocês.
Vamos lembrar que o governo, ao entrar no Lula III, aprovou uma PEC da "transição" ou popularmente chamada Pec do Estouro, de R$200 bilhões, ou seja, gastos dessa ordem que puderam passar por fora do orçamento.
Vale lembrar que naquele momento não havia ainda o novo arcabouço desenhado e, portanto, os gastos não tinham um limite de 2,5% de crescimento, baseado na receita do ano anterior. Claro, essa regra já foi alterada duas vezes ao longo do caminho e, mesmo assim, as despesas cresceram acima de 13%, já descontada a inflação. Mais uma regra desrespeitada.
O PIB é a somatória dos gastos do governo, consumo privado das famílias, investimentos e a diferença entre exportações e importações e assim, no trimestre, o crescimento foi de 0,9% (figura 1).
Aqui começam os detalhes: o PIB é dividido entre PIB na ótica da oferta (agronegócio, indústria e serviço) e na ótica da demanda (formação bruta de capital fixo que são os investimentos, consumo das famílias e consumo do governo).
Ao entendermos essa lógica, vemos que 80% do crescimento vem do consumo e este é realizado pelas famílias. De onde vem tanto poder de consumo? Do expansionismo fiscal do governo que acaba por transferir renda às famílias e estas, por sua vez, consomem no curto prazo.
Gastos governamentais em alta, dando poder de consumo às famílias, puxam o resultado final. Claro, a FBCF também surpreendeu, mas como veremos, se mantém muito abaixo da média dos países pares.
Assim, as pessoas consomem no curto prazo e majoritariamente serviços, que representam 60% do PIB nacional (figura 2) e estes não podem ser importados.
Assim, maior consumo de serviços, menor consumo da indústria e como esta representa 19% no PIB frente a quase 60% dos serviços, o resultado final também é incrementado. Ainda mais em um mercado de trabalho apertado, serviços acabam por contratar a escassa mão de obra, mesmo que com falta de qualificação e como não há incremento de produtividade, investimentos baixos e poupança menor ainda, o estímulo da demanda leva a preços mais altos com uma oferta reduzida.
A demanda anabolizada pelos gastos governamentais provoca o que chamamos de hiato do produto, ou seja, a diferença entre o PIB potencial e o PIB efetivo. Com os anabolizantes em ação, o PIB efetivo é maior que o PIB potencial e isso é inflacionário por natureza. Ou investimentos a longo prazo para incremento de produtividade ou enfrentaremos inflação (já é uma realidade).
Em paralelo, com o estímulo em serviços, a demanda da indústria cai e isso leva a maior importação do que exportação, que também foi algo verificado no resultado do PIB. Mais importação, mais saída de capital para efetuar os pagamentos no exterior desses produtos importados.
Repare a disfunção que gera um anabolizante sem o devido investimento em produtividade, que segue estagnada no Brasil. Aliás, a taxa de poupança caiu novamente frente ao PIB (14,9%) e sem poupança não há investimento perene e sólido e as taxas de investimentos (FBCF) ficaram abaixo de 18% (figura 3).
Em países da OCDE a média é acima de 20% de investimentos, portanto seguimos bem baixos e com poupança em queda.
Como esse processo de estimular o consumo é feito pelo governo? Correção do salário mínimo acima da inflação sem aumentar produtividade, indexar e vincular gastos de saúde e educação à receita líquida corrente (e estas crescem ao subir impostos), o salário mínimo à bolsa família, abono salarial, seguro desemprego, BPC, antecipação de 13° de aposentados e pensionistas. Sem contar os gastos parafiscais que o governo vem realizando sem passar pelo orçamento, muito bem documentado pelos economistas Marcos Mendes e Marcos Lisboa (braziljournal.com).
Assim, seguimos claramente para uma trajetória preocupante de aumento do endividamento, ultrapassando R$9 trilhões pela primeira vez e um déficit nominal beirando 10% do PIB, acima de R$1 trilhão por 6 meses seguidos.
O que vemos é um crescimento do PIB acelerado financiado por um déficit crescente. Diferente de 2014, onde o país produzia déficit mas não crescia, aqui crescemos nos endividando muito acima do razoável. Hoje o gasto governamental federal já ultrapassa os R$2,4 trilhões, mais de 20% do PIB, enquanto na pandemia era de R$2,5 trilhões.
Assim, as despesas do governo em 12 meses crescem a um ritmo de 13,4% em termos reais (já descontada a inflação), enquanto as receitas crescem 5,8%. A bomba está logo ali.
Resultado disso é um dólar consistente acima de R$6,00 e inflação já sendo um presente, especialmente em alimentos. Isso tende a complicar mais ainda, já que o governo vem enfrentando dificuldade em captar no mercado para fechar suas contas com títulos pré-fixados.
Com as perspectivas de boas e novas altas de juros, ninguém quer financiar o governo com juros pré e assim, o perfil da dívida do país piora, tendo que pagar mais caro para atrair capital e ainda por cima a um prazo mais curto de vencimento.
O pacote de cortes é nitidamente aquém do esperado e não atinge o coração do problema: indexação e vinculação dos gastos. O que foi apresentado é meramente eleitoreiro para deixar a dívida crescer em um ritmo menor, mas segue crescendo o endividamento público frente ao PIB já passou dos 85%, quando a média dos emergentes é de 60/65% (figura 4).
O Brasil seria fácil de arrumar, mas a mentalidade precisa mudar.
Precisamos deixar de acreditar que serviços públicos são gratuitos (são caros e ineficientes), deixar de acreditar na lógica do Estado como empreendedor e gestor. Por fim, deixarmos a livre concorrência dizer quem são os eficientes e premiá-los com a livre escolha dos consumidores e os ineficientes melhorarem ou simplesmente deixarem de existir.
Com a mentalidade mudando na base da sociedade, a janela de Overton caminha em direção à liberdade e um Estado menos presente e mais enxuto (Milei está fazendo um importante papel no mundo sobre isso) e a pressão sobre os políticos começa a ocorrer.
O processo é de longo prazo mas no final, a meritocracia e liberdade do consumidor sempre vence.
Tenha paciência, não desista e sigamos na luta mostrando às pessoas ao nosso lado como a liberdade em todos os ambientes é crucial para a geração de renda e riqueza de um país: liberdade cultural, política e econômica.
Seguimos.
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