Elton Mesquita é escritor, tradutor e roteirista na Brasil Paralelo. Seus textos fazem valer sua crença de que tudo o que pode ser dito pode ser dito claramente.
2/15 (Obviamente insights são o produto da interrelação de “n” insumos prévios, mas o processo pelo qual essas influências prévias são transmutadas em um momento “eureka!” nos é vedado e não temos nenhum controle sobre ele: a platéia do mágico só vê o coelho surgindo do nada).
3/15 Jesus surgindo no ventre de Maria sem que ela tivesse sido fecundada por um homem é o maior exemplo desse fenômeno, e nos dá um modelo para o processo misterioso pelo qual a fé surge no coração, contra todas as evidências em contrário de nossa experiência materialista.
4/15 Quando Jesus fala do Reino de Deus (que implica fé) “semelhante ao grão de mostarda”, ajuda ter em mente o significado da imagem:
5/15 Nesse sentido, à falta de fé, o grão de mostarda é o interesse (que tem feito meu amigo ponderar o assunto); esse é o fermento que pode fazer crescer a massa; é a brasa que, se soprada, acenderá o fogo — mas tem que soprar. haverá esforço; a fé não simplesmente “vem” ou está lá”.
6/15 É importante internalizar o real significado de fé: fé significa “confiança”: todos confiamos em muita coisa que não dá para comprovar; todos em algum momento pensamos “ok, vou confiar então” (às vezes com bons motivos; às vezes sem motivo, na base da pura boa vontade… e boa-fé).
7/15 Por uma dessas pegadinhas paradoxais da existência, prestar muita atenção na própria falta de fé… acaba sendo o empecilho para que a fé surja. Assim, abordando o problema racionalmente, a questão é: como driblar isso?
8/15 Escapamos da pegadinha lembrando do que o budismo enfatiza: a imagem fixa que temos de nós é um engodo (compare quem você era aos 15, 20, 30 anos), fato corroborado na constatação científica da espantosa neuroplasticidade do cérebro. Não somos cláusulas pétreas.
9/15 É um fato da vida que nós mudamos. Assim, não faz sentido se ater ao fato contingente atual da “falta de fé” como se fosse hardwired no sistema. E se esse é o caso, a pergunta é: é possível “hackear” o processo de atualização do software? Guiá-lo de alguma forma?
10/15 Religião é “self-hacking”; o indivíduo baixa patches e atualizações pro wetware; é a morte de um “eu” e do nascimento de um novo “eu”, renascido no Espírito, de que Jesus fala a Nicodemos. Por isso as pessoas refugam tanto a experiência de conversão: elas intuem que vão morrer.
11/15 Não serão argumentos que operarão o milagre de gerar a fé “do nada”, assim como não é possível fazer ninguém se apaixonar por ninguém listando razões para isso. O amor (outro milagre surgido “do nada”) é possibilitado pela convivência com o objeto/pessoa que será amada.
12/15 Recomendo a aproximação pela força de vontade, racional e voluntária, do ambiente onde se ritualiza o amor de Deus por nós — a Igreja Católica (e não ficar à espera de uma “sensação de fé”). Se você quiser morrer para que outro você nasça, aproxime-se da vida religiosa cotidiana.
13/15 Pois Deus não é um conceito, mas uma pessoa viva (que está te esperando) e — novamente — é na convivência com as pessoas que podemos começar a amá-las. O resto se encarregará de si. Como falei, às vezes optamos por confiar, pensamos “ok, vou dar uma chance”, mesmo duvidando.
14/15 O paradigma moderno da física nos fala de uma realidade probabilística: já não há mais coisas impossíveis, apenas “astronomicamente improváveis”. Assim, os milagres (algo saído do nada) ocorrem numa janela infinitesimal de probabilidade, um espaço mais do que suficiente para Deus.
15/15 No exemplo dos santos, padres e de milhões de fiéis, vemos a evidência abundante do milagre da fé: é possível!
Acho que é isso que Jesus quer: uma chance infinitesimal, pequena feito grão de mostarda, pra mostrar o que Ele pode fazer.
Uma chance é tudo de que Ele precisa.