Formado em Matemática pela Universidade Federal de Santa Catarina e phD pela Universidade do Porto. Apaixonado pela vida intelectual, Matemática, Filosofia e Tecnologia.
A Matemática é a ciência da quantidade e da estrutura. Estudar Matemática é estudar a realidade.
O filósofo Jacques Maritain mostra como surge a Matemática. Segundo ele, podemos fazer dois tipos de análises quando olhamos para um ente real:
A análise empiriológica é dividida em dois tipos de análise. A primeira é a análise empirioesquemática, que é, por exemplo, o que a Biologia faz. Ao estudar Biologia na escola, você estudava esquemas celulares, por exemplo.
Esses esquemas são montados para explicar um fenômeno real. Isso é o que Jacques Maritain chama de análise empirioesquemática.
A segunda é a análise empiriométrica, em que se usa um instrumento de medida para medir características extensivas, como peso, altura, velocidade, momento etc. Ou seja, há essa metria, essa medida que pode ser auferida.
E é exatamente nesse campo empiriométrico que a Física moderna e a Matemática entram.
Percebam que já estamos um pouco distantes do ente tal como ele se apresenta a nós na percepção, porque precisamos utilizar um instrumento de medida para chegarmos nas propriedades do ente.
Desse ponto de vista, olhamos para o ente tal como ele se apresenta para o instrumento de medida. Assim, estamos olhando para o ente ou fenômeno da realidade do ponto de vista empiriométrico, ou seja, como ele se apresenta para um instrumento de medida.
Aqui, não entram aspectos qualitativos, mas apenas os aspectos quantitativos. Mas isso não quer dizer que a Matemática se restrinja apenas ao campo da quantidade, suas origens revelam como ela é importante para entender a vida como um todo.
Um desses aspectos é o método de provas criado pelos gregos, popularizado por Pitágoras e sumarizado por Euclides.
Para termos alguma noção sobre isso, prova significa partir de um raciocínio inicial, no qual há algumas premissas iniciais, em seguida se faz um raciocínio dedutivo de tal maneira que a conclusão seja extremamente necessária, portanto, indubitável, ou seja, você não consegue duvidar da conclusão daquela prova.
As origens da matemática estão relacionadas às origens da Filosofia. Pela natureza do conhecimento da Matemática, que é de certa forma um mistério, precisamos da Filosofia, e ao mesmo tempo a Filosofia precisa da Matemática para validar os seus sistemas filosóficos.
Por que isso acontece? Porque a Matemática entra como um grande empecilho, e ao mesmo tempo, suscita no pensamento filosófico questões fundamentais.
Por exemplo:
A Biologia estuda os seres viventes; a Física estuda o ente enquanto em movimento; mas será que sobra algum espaço na realidade para a Matemática analisar? Ao fazermos perguntas como essas, já começamos a entrar no terreno da filosofia.
Por esse motivo, gostaria de começar abordando com vocês a conexão inicial que essas duas ciências tiveram.
Tudo começa com Tales de Mileto (em 624 a 546 a.C.), um présocrático que tentava encontrar, como todos os pré-socráticos da época, o fundamento para a realidade, o fundamento para o real.
Para Tales de Mileto, o fundamento da realidade era a água, mas além de investigar este assunto, Tales também teve contato com a Matemática egípcia e de outras civilizações.
Naquele tempo, a Matemática era utilizada simplesmente com fins práticos de agricultura, de relações econômicas, etc. Ou seja, havia um fim prático, eles aprenderam uma metodologia de contagem e desenvolveram alguns sistemas.
Não se chegou ao estágio moderno do pensamento abstrato da Matemática tal como nós o conhecemos hoje, mas, ao contrário, havia só e simplesmente uma questão prática, necessária para a civilização em que eles viviam.
Tales teve contato com isso e, pela primeira vez na história, conseguiu abstrair coisas comuns daquela Matemática prática. Com isso, desenvolveu os “teoremas de Tales”. Nesse estágio do conhecimento matemático, estamos falando de uma interligação entre Filosofia e Matemática, ou seja, tudo se intercalava, não havia uma divisão de ciências ainda.
Quando Tales fazia as abstrações do conhecimento matemático — que ele toma daquelas outras civilizações —, estava, em certa medida, fazendo Filosofia também.
Portanto, o seu ensinamento matemático se confundia com a própria Filosofia que ele estava elaborando, e ele formulou aqueles seus primeiros teoremas percebendo esses padrões de abstrações que existiam, mas não apresentou demonstrações.
O que conhecemos como demonstração é algo muito posterior, mas mais adiante falaremos sobre isso. O importante agora é saber que Tales não deu provas, ele apenas formulou e apresentou pela primeira vez a possibilidade de um conhecimento imutável.
Ou seja, temos aqui algo que parece ser imutável, e não depende da experiência sensível, embora ele não tenha apresentado provas — ele apresentou algumas provas apenas, mas não provas como nós as conhecemos.
As provas propriamente ditas aparecem um pouco mais tarde, em 570 a.C., com Pitágoras de Samos.
Pitágoras é outro pensador que está inserido no contexto dos pré-socráticos de tentar encontrar o fundamento da realidade. Ele também teve contato com a civilização egípcia, mesopotâmica, e com a Matemática desenvolvida por eles e por Tales.
Para Pitágoras, o fundamento da realidade estava em um conceito em estado de pré-determinação no seu período: o conceito de número. Ele é o primeiro pensador que enxerga a realidade como número.
Isso não quer dizer que o número é um aspecto do real como nós o somos, mas quer dizer que Pitágoras enxergava a essência das coisas (no sentido platônico e aristotélico, explicado no curso Matemática e o Espírito Filosófico, no Núcleo de Formação da Brasil Paralelo), como número.
Isso quer dizer que todo o real se reduz ao conceito de número, tanto exotérica quanto esotericamente, para Pitágoras. Mas, mais do que isso, além desse caráter filosófico já de início, a Matemática também tinha na escola pitagórica um caráter iniciático, porque esse seria um conhecimento, de certa forma, gnóstico que você teria acerca da realidade.
A pessoa precisava passar por um ritual de iniciação para entrar na escola pitagórica e ter acesso a esse conhecimento. Então, a escola pitagórica entra para a história surgida como uma espécie de irmandade.
Quando digo que era uma escola iniciática, é porque realmente funcionava dessa forma. E esses membros esotéricos da escola pitagórica eram chamados de matemáticos, ou seja, é a primeira vez que aparece o termo matemáticos.
Os termos matemáticos e Matemática que temos hoje se devem a Aristóteles. É este último quem fará as divisões das ciências e definirá a Matemática de um jeito claro, porque ele tem uma filosofia subjacente para definir a Matemática.
É por causa de Aristóteles, portanto, que entra para a história o que chamamos hoje de Matemática.
Vamos recapitular: Pitágoras via o número como a essência das coisas, ou seja, as coisas mesmas são números, tudo é número.
E se o número é a essência das coisas, isso significa que não dependemos da experiência sensível, ou seja, o número já tinha essa característica de imaterialidade antes mesmo que pudesse haver a experiência.
Então, se ele está na essência de todas as coisas do mundo real, para Pitágoras, não precisamos da experiência sensível para saber do mundo real, basta nos restringirmos à Matemática, ao conceito de número e desenvolver todo um conhecimento acerca disso. Pitágoras é um pensador que realiza essa tarefa.
Ele apresenta pela primeira vez algumas noções de provas — falo mais sobre isso no curso Matemática e o Espírito Filosófico, explicando o que é uma prova matemática e como você consegue um conhecimento matemático. Toque aqui para garantir seu acesso ao curso.
No entanto, para termos alguma noção sobre isso, prova significa partir de um raciocínio inicial, no qual há algumas premissas iniciais, em seguida se faz um raciocínio dedutivo de tal maneira que a conclusão seja extremamente necessária, portanto, indubitável, ou seja, você não consegue duvidar da conclusão daquela prova.
Pitágoras realizou este feito pela primeira vez. Com isso a Matemática dá esse salto abstrativo — lembrem-se de que antes a Matemática era usada para fins práticos — e começa a produzir um conhecimento que se confunde com o conhecimento filosófico.
Nesse momento ainda estamos no berço da Filosofia ocidental.
Pitágoras apresenta para nós a Matemática como a produção de um conhecimento indubitável, que, apreendido, não há mais o que possa ser mudado. Isso é quase dizer “verdade conhecida, verdade obedecida”..
Para Pitágoras, o conhecimento da Matemática é uma verdade acerca da realidade, e é o único meio de se chegar no real, porque ele via a essência de todas as coisas no número.
Para isso não é necessária a aparência sensível. Posteriormente esse modo de ver influencia todo o pensamento grego — veremos isso mais a fundo quando abordarmos Platão e Aristóteles.
A escola pitagórica se espalha, e começam a ser desenvolvidos os teoremas da Matemática como nós os conhecemos hoje — todos nós conhecemos o teorema de Pitágoras, por exemplo.
O teorema de Pitágoras foi descoberto na escola pitagórica. Ele diz que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa em um triângulo retângulo (em geometria euclidiana).
O argumento de Pitágoras é uma coisa que se aplica a qualquer triângulo retângulo; não precisamos conferir muitos triângulos retângulos para termos certeza deste conhecimento, basta que seja demonstrado.
Disso decorre a importância da demonstração na Matemática: uma vez que você demonstra o resultado, ele é verdade e não há o que discutir. Mesmo sem conhecer o teorema de Pitágoras, ele já era uma verdade antes de sua própria formulação, em qualquer lugar em que pudesse ser testado, pensado etc.
Esse novo tipo de conhecimento trazido por Pitágoras espanta os gregos. O primeiro deles a se espantar com isso foi Platão, o que influenciará profundamente todo o seu pensamento e toda a cultura ocidental.
Mais importante do que todos esses personagens envolvidos nessa história é o fato de que a Matemática tem a capacidade de produção de um conhecimento necessário e indubitável, sobre o qual ninguém poderia duvidar.
Uma vez que você entende uma demonstração ou prova, você não tem simplesmente a apreensão daquela proposição, mas uma espécie de visualização metafísica de uma verdade.
É isso que esses filósofos viam na Matemática e está por trás de todos esses desenvolvimentos.
Até a Modernidade, até o surgimento do Nominalismo, todo mundo via a Matemática assim. Ou seja, a Matemática entrava na disciplina de preparação da alma para conduzir à verdade e preparar para o espírito filosófico.
É por isso que este curso leva o nome de Matemática e o Espírito Filosófico, porque quero resgatar a vocês essa capacidade que tem a Matemática.
A importância de se conhecer a Matemática é que ela serve como uma espécie de antídoto contra o relativismo, porque você perceberá suas características, necessidades e atributos semidivinos, e a olhará de maneira realista.
Mesmo que alguém diga que a verdade é uma construção social, você não aceitará essa forma de pensamento, porque você percebeu os atributos de necessidade quando estudou matemática.