Durante a Guerra do Vietnã, o país estava polarizado, assim como boa parte do mundo. Ao norte, o Vietnã era governado por Ho Chi Minh, um líder comunista aliado à União Soviética. Já o Vietnã do Sul era governado por Ngo Dinh Diem, presidente apoiado pelos Estados Unidos da América.
O combate não era apenas entre Sul e o Norte, mas sim um confronto indireto entre Estados Unidos e União Soviética na chamada Guerra Fria. Isso deu uma proporção global à guerra, holofotes, narrativas e milhões de mortos, órfãos, feridos e cidades destruídas.
A Guerra do Vietnã é considerada uma consequência da Guerra da Indochina. Esse foi um conflito que ocorreu entre 1946 e 1954 travado entre os vietnamitas liderados pelo grupo Vietminh de Ho Chi Minh contra os franceses.
Em 1884, na época em que os impérios europeus controlavam vários territórios na África e na Ásia, os franceses assumiram o poder na região do sudeste asiático, conhecida como Indochina. Em 1925, o líder Ho Chi Minh fundou o Partido Comunista Indochinês (PCI). Cinco anos depois, esse partido iniciou revoltas violentas no norte que foram derrotadas, mas que já davam um sinal de reação da colônia.
Na Segunda Guerra Mundial, a França foi derrotada pela Alemanha. O enfraquecimento desse país gerou uma oportunidade para que o Japão, aliado da Alemanha, tentasse ocupar a Indochina.
Ho Chi Minh tinha planos próprios, queria a independência do Vietnã e criou um movimento chamado Vietminh para conseguir isso pela força, afirmou o historiador Demétrio Magnoli em seu livro História das Guerras. O movimento de Ho Chi era comunista e nacionalista.
Esse movimento foi bem-visto pelos americanos que lutavam contra o Japão. O objetivo do apoio era conter a expansão do Eixo, que era composto pelos japoneses e pelos nazistas.
A França ficou dividida, a parte dominada pelos nazistas foi contra esse movimento, a chamada República de Vichy. Já a parte próxima aos Aliados, de Charles de Gaulle, apoiou os vietminh.
Com o fim da guerra, a Conferência de Potsdam definiu que o Vietnã seria dividido em dois: Sul e Norte. Em agosto do mesmo ano, Ho Chi Minh iniciou uma insurreição para tomar o país inteiro. Ele proclamou a República Democrática do Vietnã.
Em 1946, a reação francesa dominou a região equivalente ao Vietnã do Sul. Diante dessa disputa, os franceses bombardearam o porto de Haiphong dando origem à Guerra da Indochina.
O exército vietnamita era menor, menos equipado e tinha menos treinamento do que o exército francês. Por isso eles empregaram táticas de guerrilha para conseguir vencer. O general Giap, homem responsável por liderar os vietnamitas, disse:
“Será a guerra entre um tigre e um elefante. Se acaso o tigre parar, o elefante o transpassará com suas poderosas presas: só que o tigre não vai parar; ele se esconde na selva durante o dia para só sair à noite; ele se lançará sobre o elefante e lhe arrancará o dorso por grandes nacos, depois desaparecerá e, lentamente, o elefante morrerá de exaustão e de hemorragia.”
A lógica da Segunda Guerra Mundial agora estava invertida. Os aliados não apoiavam mais Ho Chi Minh, ele era um líder comunista apoiado pela União Soviética e China, inimigas dos ocidentais. Os Estados Unidos e a Inglaterra estavam ao lado da França.
A ação tática e militar de Giap, que liderava os vietnamitas nas guerrilhas, surpreendeu os franceses. Eles sofreram duras perdas e ficaram em uma situação insustentável.
Charles Piroth, líder de artilharia da França, chegou a tirar a própria vida após se sentir humilhado pela vitória de Giap. Cercados, os franceses passaram a negociar a sua retirada do Vietnã.
O Vietnã, o Laos e o Camboja passaram a ser reconhecidos internacionalmente como estados independentes. Contudo, o Vietnã foi dividido entre Sul e Norte, o que mantinha a tensão da Guerra Fria no país e transformava a nação em um barril de pólvora pronto para explodir.
Após a guerra da Indochina, a disputa entre Sul e Norte continuou intensa. Em 1956, as eleições do Vietnã do Sul não aconteceram após Diem, presidente do Vietnã do Sul, acusar influência dos comunistas do Norte. Ele dizia que os Vietminh estavam promovendo uma campanha de terror contra os militares do Sul.
O historiador Bevin Alexander definia o governo de Diem da seguinte forma:
“Diem criou uma oligarquia estreita e autoritária, composta principalmente por membros de sua família e de amigos católicos. A oligarquia explorava seus cargos para ganhos pessoais, perseguia budistas e opunha-se a reformas, protegendo as propriedades de latifundiários e exigindo dos camponeses pagamento pelas terras recebidas dos Vietminhs.”
Essa perseguição aos budistas gerou cenas marcantes no Vietnã. O monge Thích Quàng Dúc ateou fogo em seu próprio corpo como forma de protesto:
Essa perseguição religiosa fez com que Diem recebesse a antipatia de grande parte da população, que era budista. Os comunistas viram nisso uma oportunidade de atuar. Em 1960, Ho Chi Minh criou a Frente de Libertação Nacional (NLF) que objetivava derrubar Diem e unificar o Vietnã, instaurando um governo socialista.
Os Estados Unidos auxiliaram o Sul por meio da estratégia chamada guerra por procuração. Com o intuito de prejudicar a União Soviética, os EUA financiavam o Sul para fortalecê-los contra o avanço dos comunistas. Essa era uma forma de interferir, mas sem se envolver diretamente com a guerra.
Essa relação com o Sul foi abalada após os protestos dos budistas que ganharam proporção mundial e chocaram a opinião pública.
Os americanos se distanciaram do governo de Diem e foram lenientes com um golpe conduzido pelos altos militares do Vietnã do Sul que derrubou Diem. O ex-presidente foi preso e pouco tempo depois apareceu morto.
Com o novo governo, os EUA voltaram a se aproximar do Sul e a financiar o conflito contra o Norte, mantendo a postura de não se envolver diretamente. Isso mudou no ano de 1964, quando o presidente Lyndon Johnson autorizou o bombardeio aéreo a territórios norte-vietnamitas.
Ele usou de pretexto o Incidente do Golfo de Tonquim. Supostamente navios americanos haviam sido atacados pela marinha do Vietnã do Norte.
O Governo do Vietnã do Norte confirmou apenas um dos ataques, alegando que o navio americano havia invadido seu território marítimo. Em 2005, a Agência de Segurança Nacional (NSA) confirmou que o ataque não reconhecido pelos norte-vietnamitas realmente não havia sido confirmado nem pelos americanos.
O exército dos EUA era muito superior ao do Vietnã do Norte. Possuía mais poder bélico, treinamento e dinheiro. Isso fez com que os americanos tivessem vitórias estratégicas, como na batalha de Cedar Falls, Rolling Thunder e Junction City. Os americanos apelidaram os guerrilheiros do Norte de vietcongues. Esse termo significava “vietnamita comunista”.
O início do conflito dava a entender que a guerra duraria pouco tempo. Os americanos eram muito superiores no campo de batalha e colecionaram vitórias. A tropa estava com a moral elevada pela luta contra o comunismo e no cumprimento do dever. Essa situação mudou.
O clima do Vietnã causou um forte impacto negativo nos americanos: muito calor, matas deixando o ar úmido e chuva constante. Além do clima estranho, os mosquitos causavam doenças tropicais que os soldados não estavam preparados para enfrentar.
Nas matas molhadas, com o clima estranho e as novas doenças, os soldados suavam e cansavam-se mais rapidamente que o normal.
Jovens de todos os cantos dos Estados Unidos da América foram mobilizados para o conflito. Longe da família, era comum no cenário da guerra assistirem aos seus amigos morrerem a sangue frio para os vietcongues.
“Durante uma sessão de tortura de rotina com um gancho de ferro que pendia do teto, os vietnamitas amarravam as mãos e pés de um prisioneiro e depois ligavam-nas a seus tornozelos — às vezes atrás das costas, às vezes na frente. As cordas eram apertadas a tal ponto que impediam a respiração, e o prisioneiro era içado no gancho.” (Sam Johnson, ex-prisioneiro na Guerra do Vietnã)
Com a escalada da violência, a moral da tropa americana foi diminuindo. Do outro lado, os vietnamitas tinham uma motivação forte. Eles lutam pela defesa de seu território e pela defesa do regime comunista e nacionalista de Ho Chin Minh.
O exército dos vietcongues aumentou ainda mais a violência aplicando táticas de guerrilha no combate. Misturando-se em meio à população e se escondendo em túneis, os vietcongues promoveram ataques surpresas, rápidos e letais.
Em resposta, os soldados americanos começaram a agir cada vez mais fora das regras, afirma o historiador Max Hastings no livro Vietnã — Uma Tragédia Épica. Os crimes de guerra cometidos pelos americanos foram: ataques a civis, uso de armas químicas como agente laranja e estupros às mulheres vietnamitas.
A guerra aparentava ser rápida, com possibilidades de uma vitória tranquila para os Estados Unidos, mas ela causou consequências ainda maiores.
Enquanto a guerra acontecia, a política americana e mundial estava turbulenta. A luta dos negros pelos direitos civis nos EUA ganhava força. Nos anos 60, vigorava um regime de segregação social onde negros tinham direitos inferiores aos dos brancos. Os ônibus eram divididos, existia bebedouro para negros e brancos e grupos racistas tinham influência política.
Em 1964, Martin Luther King Júnior ganhou um Nobel da Paz pela sua luta contra o racismo. Ele foi um nome famoso na luta pelos direitos civis dos negros americanos. Naquele ano foi aprovada a Lei dos Direitos Civis que proibia a discriminação racial nos Estados Unidos.
O movimento cresceu e já havia feito grandes manifestações como a marcha de Washington em 1963, onde Luther King fez o seu mais famoso discurso:
Junto do movimento dos Direitos Civis, crescia também o movimento da contracultura. Massas de pessoas, formadas principalmente por jovens, acusavam a sociedade ocidental de impor uma moralidade opressiva. Defendiam a liberdade sexual, o uso recreativo de drogas e o fim do conflito.
Esse movimento foi potencializado pela cultura hippie, punk e por surgimento de bandas como The Beatles. As ideias que embasaram a revolta desses jovens se originam da chamada Escola de Frankfurt.
Em meio a esses movimentos, a pauta da Guerra do Vietnã se tornou protagonista. Essa agitação social fez com que grupos cada vez maiores fossem às ruas protestar pela saída da América do conflito.
Esse movimento começou sendo puxado pelos jovens de mentalidade revolucionária e por grupos de direitos civis que denunciavam o racismo na convocação dos militares. Logo ele foi se ampliando para outros grupos sociais, incluindo pais que perderam seus filhos na guerra. O governo americano assistia a Guerra do Vietnã se tornar cada vez mais impopular.
A violência na Guerra já era conhecida em todo o mundo por mais que o governo americano tentasse amenizar. O uso de arma química, como o Agente Laranja, e a bomba incendiária, como o napalm, foram amplamente denunciados como um abuso dos Estados Unidos.
A China comunista e a União Soviética financiavam o Vietnã do Norte que promovia tortura e matava americanos a sangue frio. O povo americano não queria mais enviar seus filhos para a guerra. O conflito passou a ser desprezado pela população. Os protestos da população aumentaram nos Estados Unidos.
No campo militar, os americanos continuavam a enfrentar dificuldades para combater os vietcongues no território que eles conheciam. O desconhecimento do espaço somado ao desespero, fez com que os EUA lançassem mão de muitos ataques aéreos. Em março de 1968, os EUA atacaram uma aldeia por engano, acreditando que lá estavam vietcongs escondidos.
Cerca de 500 vietnamitas civis foram mortos no ataque, o que ficou conhecido como o massacre de My Lai, que era o nome da aldeia. Isto teve uma péssima repercussão internacional para o governo americano.
A situação demonstrava instabilidade política e militar dos EUA. Em janeiro desse mesmo ano, 1968, começou a Ofensiva do Tet.
No dia 31 de janeiro de 1968, após uma trégua devido a um feriado vietnamita, os vietcongues fizeram um ataque simultâneo a 36 capitais do país. Foi uma explosão de conflitos que resultou em milhares de mortes.
Os americanos, juntos aos vietnamitas do Sul, levaram a melhor e conseguiram reduzir muito o poder de fogo de Ho Chi Minh. O problema para os americanos é que alguns desses conflitos ocorreram em locais próximos à embaixada e foram televisionados em tempo real para o mundo todo.
Os comandantes americanos no Vietnã pediram mais soldados à Casa Branca, o que foi negado. Os americanos civis não defendiam mais a guerra. A pressão para a saída dos EUA era grande.
Mesmo depois de uma vitória do ponto de vista tático, sem o braço político a guerra era insustentável.
A estratégia americana foi treinar os sul-vietnamitas para que eles pudessem terminar a guerra sozinhos agora com o Norte enfraquecido. Apenas cinco anos depois, em 1973, foi assinado o Acordo de Paris que cessou o fogo e permitiu a evacuação das tropas americanas.
Não houve paz quando os americanos saíram do país. De maneira violenta e rápida, o Vietnã do Norte atacou o Sul e conquistou o controle do país em abril de 1975, dando fim à guerra.
Em 1976, o Vietnã é oficialmente reunificado sob o domínio do governo comunista. A capital do Vietnã do Sul, Saigon, é rebatizada de Cidade de Ho Chi Minh em homenagem ao líder do Norte que morreu em 1969, antes de ver o sucesso do seu movimento.
O intelectual Carl von Clausewitz defende que a guerra pode ser simplificada em três pilares:
Do ponto de vista da habilidade, mesmo enfrentando grandes dificuldades, os Estados Unidos tinham recursos para continuar lutando. Então por que ele decidiu se retirar da Guerra do Vietnã?
Porque os outros dois pilares estavam abalados. O povo já estava emocionalmente contra a guerra, não viam propósito naquilo e tinham medo de verem filhos ou conhecidos irem morrer no conflito. O governo americano é uma democracia, e sem o apoio do povo ele não consegue se manter favorável ao conflito.
Nas eleições, cada vez ficava mais difícil que alguém que se posicionasse favorável à continuidade da guerra fosse eleito, assim, a situação se tornou insustentável.
Os detalhes da guerra que mobilizou as duas maiores potências do mundo em um conflito no Vietnã estão explicados no documentário A Guerra do Vietnã: um filme de Ken Burns e Lynn Novick.
O documentário impressiona pela riqueza de detalhes e por trazer os fatos sem tentar favorecer qualquer um dos lados.
É um relato histórico que você pode assistir no streaming da Brasil Paralelo. Clique aqui e saiba exatamente como assistir.
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