“O diagnóstico de uma existência humana — de um homem, de um povo, de uma época — deve começar identificando o sistema de suas convicções e crenças.” José Ortega y Gasset
Ortega y Gasset indica que para analisar civilizações antigas é necessário compreender suas crenças e convicções, esses fatores são definidores de como um povo vive. Na modernidade houve uma substituição do sistema de crenças, da referência de autoridade e a perspectiva do saber, tudo isto deu origem ao processo de secularização.
É possível ter um panorama de como era a vida, o pensamento e a organização do homem medieval, imbuído de valores religiosos. Mas e quanto ao homem moderno? Quais são as suas crenças?
As novas crenças do homem moderno ocidental tinham como base a formação de uma nova realidade, e nessa nova realidade teriam de ser estabelecidas novas organizações, e essas, por sua vez, não seriam mais formadas pela instituição da Igreja. Outra instituição humana tomará o seu lugar.
O termo “secularização” é o processo gradual de abandono dos preceitos culturais, sociais, morais e políticos que se apoiam na religiosidade. A secularização envolve o surgimento de um novo modo de vida que não mais está estruturado em torno de uma visão firmada em hábitos ligados à religião.
A cultura, a política, a moral, o direito, os códigos éticos e os processos legais não mais se sustentam em preceitos religiosos. As sociedades criam códigos legais para substituir essa lacuna deixada pela religião.
“O renascimento é a última fase do medievalismo, ele foi a obra de indivíduos, do individualismo”. Paul Johnson
Para o historiador, a Idade Média não acabou e começou o Renascimento, nem o Renascimento foi a negação total da Idade Média, ele foi uma transição.
O Renascimento compreende os séculos XIV, XV, XVI, e um pedaço do XVII. Há, nesse período, grandes movimentos que se manifestam não apenas nas artes, mas também em vários outros saberes.
Uma frase de Protágoras resume a mentalidade do Renascimento: “O homem é a medida de todas as coisas.”. Nesses séculos, essa máxima se manifestará na política, na economia, na sociedade, na cultura, na religiosidade e nas ciências.
A secularização de todos esses campos teve início no renascimento. Com o iluminismo, essas noções se aprofundaram junto da ideia de novo homem que os pensadores das luzes teorizaram.
Na modernidade, o advento das ideologias aprofundou a secularização. Mais que uma separação entre as esferas humanas e religiosas da vida, as ideologias promovem uma verdadeira destruição dos símbolos e legados da religião.
O coletivismo medieval começa então a dar lugar ao individualismo renascentista. Por exemplo, as universidades, de certa forma, começam a perder alguns de seus estudantes, pois eles estão agora em busca de mestres.
Leonardo da Vinci, por exemplo, não estudou em nenhuma escola, ele era membro do ateliê de Verrocchio. Seja, portanto, nas áreas das artes, política ou letras, os renascentistas estão à procura de mestres, ou seja, de um indivíduo; logo, a razão passa a ser algo mais desejado do que a fé.
O termo Renascimento significa “renascer algo”, neste momento houve um:
Durante o período do Império Romano as cidades e o comércio eram florescentes. Na Idade Média, porém, enfrentaram um período declinante. Esse é um momento de ressurgimento.
Na literatura, Dante, ao fazer de Virgílio um dos seus personagens principais e guia, está retomando, renascendo, um poeta latino.
A ideia do Renascimento é de revivescência dos padrões clássicos greco-romanos. É por isso que a figura humana, em todos os seus aspectos, será usada e abusada durante esses séculos.
O Renascimento é o período que marca o fim da Idade Média. O termo “renascer” evoca diversas dinâmicas políticas, sociais e filosóficas que voltam a ser influentes na organização social e política do povo europeu.
Esse período ficou marcado como um primeiro passo para a secularização do ocidente. O pensamento filosófico e as artes passaram por transformações.
Com as Cruzadas, rotas comerciais para o Oriente que estavam fechadas voltaram a ser exploradas pelos reinos europeus.
O contato com a cultura árabe também permitiu diversas trocas culturais e intelectuais que influenciaram as universidades europeias.
Em meio a esses acontecimentos, as cidades, ou burgos, voltavam a ter uma vida mais ativa, economicamente e politicamente. Dando origem a um novo grupo de comerciantes que ficou conhecido como burguesia.
Nas artes, na filosofia e na ciência, elementos clássicos do pensamento greco-romano foram retomados. Diversas correntes se desenvolveram a partir da união de todos esses fatores.
As principais correntes que se desenvolvem no Renascimento são:
Os renascentistas não enxergavam os medievais como obscurantistas, esta visão aparece apenas no período do Iluminismo. Além disso, tanto o antropocentrismo quanto o cientificismo não tornam os renascentistas homens ateus, sem fé.
A visão de mundo que tinham unia uma fé religiosa à percepção de Deus como um arquiteto que organiza e orquestra o mundo natural enquanto o homem cuida do seu dia a dia.
Uma obra renascentista que ilustra bem essa nova visão de mundo secularizada é o afresco “A criação de Adão”, no teto da Capela Sistina.
Concebida por Michelangelo, foi um trabalho feito a pedido do Papa Júlio II. É possível perceber nesse afresco a ideia deísta: de um lado há Deus, simbolizando a fé, e do outro tem o homem, representando as ideias racionais.
Observando a obra com atenção, é possível perceber o braço esquerdo do homem relaxado e seu dedo indicador quase tocando o dedo de Deus, que está com a mão e o braço todo esticado, tentando encostar no homem.
A mão do homem é mole e sem vontade de querer tocar a mão de Deus. Deus está fazendo um esforço para tocá-lo, e o homem está enfraquecido, letárgico, nu.
Essa nova visão de mundo demonstra como a cosmovisão daqueles homens passou por uma espécie de virada.
Essa mudança é fruto da secularização de estruturas tradicionais da sociedade humana, como o Estado, as universidades e a Igreja. O Renascimento trouxe as sementes dessa doutrina com as novas ideias de valorização do homem, da natureza e da razão.
Além disso, o Renascimento desenvolveu diversos círculos intelectuais por toda a Europa, que passaram a defender ideias de liberdade econômica e política.
A razão passou a sobrepor à fé: somente por meio da razão se poderia alcançar o conhecimento de todas as coisas e promover o progresso da humanidade.
Na França do século XVII, o filósofo René Descartes (1596-1650) foi o precursor do pensamento iluminista. Considerado pai do racionalismo, valorizou em sua obra a obtenção do conhecimento exclusivamente pela razão, uma vez que a verdade reside nas abstrações da consciência humana.
No Iluminismo, algumas doutrinas irão reforçar o pensamento renascentista e aprofundar a secularização da sociedade. As principais ideias iluministas que reforçam isso são:
O Iluminismo é a principal corrente que contribui para a virada do pensamento humano para o racionalismo. Como essa corrente filosófica tem implicações políticas, sociais e morais, ela contribuiu para o avanço da secularização no ocidente.
O Iluminismo deixou grandes marcas na História. Suas principais características foram:
É a partir dos escritos dos iluministas que os Estados passam a romper com as hierarquias religiosas e assumirem a autoridade completa do poder para si.
Na Idade Média era comum ver monarcas recuando em decisões por influência de bispos ou do Papa. A religião, esfera espiritual, possuía grande influência nas decisões temporais dos homens, esfera humana.
Qualquer rei que pretendesse sobrepor às leis naturais ou às leis da Igreja, era considerado um tirano e sofria sanções de seus súditos e da Igreja.
A soberania do poder não residia no rei, ou no Estado, mas na vontade de Deus. Com o advento da modernidade e das ideias iluministas a soberania do poder é tomada pelo rei.
Os reis da modernidade tomam como pretexto as ideias iluministas e promovem a separação do Estado e da Igreja para concentrar todos os poderes em suas mãos.
Esse foi um passo importante para a secularização do mundo.
No dia 17 de setembro de 1303, Filipe, o Belo, mandou diversos homens armados até Anagni, onde o Papa Bonifácio VIII estava, exigindo que ele renunciasse do poder, uma vez que ele estava contrariando os desejos do rei da França.
Diante de tal afronta, Bonifácio VIII exclamou que poderia ser assassinado, mas que morreria como Papa.
Diante da exclamação, Sciarra Colonna, inimigo do sumo pontífice, ignorou sua religião e a importância do Papa, e esbofeteou Bonifácio.
O episódio marca o período no qual os reis deixaram de enxergar o Papa como seu superior e passaram a se enxergar como o poder mais importante da Terra.
A própria classe que financiou o crescimento do poder dos reis absolutos viria a destituí-los de seus tronos. A burguesia não se contentou em deter apenas o poder econômico.
Influenciados pelas ideias iluministas, os burgueses passaram a defender teses de que a soberania do poder reside no povo e não no rei. Essa ideia tem base na noção de contrato social desenvolvida por Thomas Hobbes.
Os burgueses passaram a financiar praticamente todas as revoluções da Idade Moderna, buscando não encontrar mais quem os pudesse impedir de crescer.
Foi nesse período que as monarquias caíram e as Repúblicas surgiram — com a burguesia no poder.
Max Weber é considerado um dos pais da sociologia moderna. Destacou-se com a escrita de sua obra mais famosa: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Dentre os diversos temas que analisou em seu trabalho, o autor dedicou-se à questão da secularização.
Para ele, o período da modernidade é marcado pelo conflito incessante entre o pensamento baseado na razão prática e o pensamento tradicional religioso. A razão era como uma ferramenta instrumental para atingir determinados fins, ao passo que o pensamento religioso ia perdendo relevância entre os homens.
Weber concluiu que grande parte da vida social foi reduzida à lógica racional. Weber também faz alusão a esse fenômeno ao chamá-lo de “o processo de desencantamento do mundo”, em que o sujeito moderno se despe de costumes e crenças baseadas em tradições herdadas ou aprendidas que se apoiam nos pilares fixos das religiões ou da magia.
Explicações e questionamentos baseados na utilização da razão instrumental rompem com noções preconcebidas e ancoradas no núcleo religioso tradicional.
Weber atribuiu ao momento de crescimento histórico do sistema capitalista, que ganhava grande fôlego diante da enorme produção que a Revolução Industrial permitia, o ponto principal do processo de secularização.
O lucro se tornava prioridade nas relações comerciais, o que exigia em grande parte a racionalização das ações dos sujeitos.
Isso se estendeu e alcançou as demais organizações e instituições do Estado moderno. Os novos regimes passaram a separar questões públicas das religiosas, racionalizando e formalizando o Direito Civil.
Junto de Max Weber e Émile Durkheim, Karl Marx é considerado um dos pais da sociologia. Em sua obra, a secularização deixa de ser um fenômeno analisado, como foi em Weber, e passa a compor a ideologia que Marx enxergava como caminho ideal para o mundo.
Para Marx, a religião era “"o ópio do povo”. Para Marx, a espiritualidade nada mais era que uma das formas de alienação das classes trabalhadoras.
O idealizador do socialismo científico sequer acreditava que havia uma dimensão espiritual da vida humana. Para ele, tudo estava restrito ao material.
O Brasil passa por um processo de secularização após o advento da República em 1889. Até então, sob o regime da Constituição de 1824, o império brasileiro tinha como religião oficial o catolicismo.
A tendência das novas repúblicas europeias era justamente a separação entre o Estado e a Igreja. Já no Brasil havia um regime que aproximava a monarquia da Igreja: o Padroado.
O Padroado prescrevia legalmente a possibilidade de o imperador intervir e legislar em assuntos de competência eclesiástica.
Somente com a Constituição da nova república que o Brasil tornou oficial a separação entre Estado e Igreja.
Apesar da separação legal, o povo brasileiro é fortemente conhecido por sua religiosidade. É comum ver em períodos eleitorais candidatos se aproximando de grupos religiosos para garantir uma boa imagem e angariar mais votos.
Mesmo com as tendências secularizantes no direito e nos meios intelectuais, o Brasil preserva aspectos tradicionais da religião como um norteador de seus valores.
Há a guerra dos tanques, das granadas, dos aviões. E há a guerra silenciosa, sem violência, sangue ou explosões; uma guerra sem canhões, bombas ou espadas, cujas armas são imagens e palavras.
Uma guerra diferente, que, devagar e sempre, vai destruindo a história, matando os heróis e suas jornadas.
Era o ano de 1883 quando, na Inglaterra, um grupo de intelectuais se uniu para fundar uma sociedade que tinha como objetivo implantar o socialismo de forma gradual, sem uma revolução armada e com uma estratégia que consistia em vencer suas batalhas sem um ataque direto. Sem confrontos.
Mudar a cultura era o meio para chegar a um fim. Por isso, treinaram jornalistas, oradores, políticos, escritores e dramaturgos.
“A realidade está definida com palavras. Portanto, quem controla as palavras controla a realidade”, disse um dos mais famosos marxistas da história.
Os fundadores da Sociedade Fabiana sabiam que para uma mudança no pensamento deveriam começar pela linguagem. Era preciso dominar a linguagem para conseguir transformar o senso comum.
Eles sabiam que a cultura tem o poder de moldar o pensamento individual. Essas eram as armas nessa guerra silenciosa.
Eles também sabiam que as palavras do livro que você lê enchem de imagens a sua cabeça. Assim como o filme que você assiste, a música que você ouve e canta, as notícias do jornal, as propagandas. Tudo vira imagem.
Tudo o que você ouve, vê ou lê, vai para dentro de você. Isso é o que chamamos de imaginário: é como se fosse um armário que guarda toda a nossa imaginação.
Eles só precisariam, então, escrever ou dizer as palavras certas para influenciar o imaginário das pessoas com as ideias erradas.
Mas o que eles ainda não sabiam é que acabariam enfrentando fortes oponentes.
Para contar as origens dessa guerra silenciosa, a Brasil Paralelo reuniu uma tropa de pesquisadores, roteiristas e especialistas e foi para o campo de batalha munida do desejo de produzir o primeiro documentário brasileiro sobre os três grandes heróis que são a resistência na guerra cultural.
O resultado é o mais novo original BP: Guerra do Imaginário – A jornada de Chesterton, Lewis e Tolkien.
Toque no link e saiba mais sobre Guerra do Imaginário.
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