Eugenia é uma teoria que atenta contra a humanidade e fere os direitos mais invioláveis da dignidade humana. Ainda é necessário estudar eugenia porque, com contornos mais sutis, ela permanece presente na sociedade, ocultada por uma nova roupagem ideológica.
Algumas culturas ao longo da história tinham o costume de eliminar pessoas deficientes ou enfermas logo que nasciam. Espartanos, celtas e povos indígenas são exemplos. Essa prática, hoje claramente vista como um atentado aos direitos humanos, visava manter as tribos apenas com os mais aptos à sobrevivência. O problema é que isso ainda acontece hoje.
O que antes era fruto de culturas menos civilizadas ganhou contornos científicos e adesão de intelectuais. A eugenia é uma prática que ainda não foi totalmente abolida da sociedade moderna. Discriminação e racismo são exemplos das motivações atuais.
Foi o Movimento Eugenista que emprestou suas ideias ao Nazismo e fundamentou teorias de pureza racial. As principais consequências do movimento foram:
Contra os eugenistas, os pensadores G.K. Chesterton e C.S. Lewis estão entre os que mais mostraram como a eugenia é consequência de uma ciência destituída de moralidade.
Certa vez, um pensador se perguntou como identificar quem eram os melhores seres humanos da sociedade. Em outras palavras, na espécie humana, qual ser humano é melhor para se reproduzir e manter as melhores características para as próximas gerações?
Para responder a essa pergunta, o matemático Francis Galton (1822-1911) cunhou o termo “Eugenia”. A etimologia deriva do grego e significa “bem nascido”, ao misturar as palavras “Eu”, que significa “bom” e “Genia”, que é “nascimento”.
O conceito de Galton defendia a seleção de pessoas que podem nascer e se reproduzir com base em características como cor de pele, atributos físicos e aptidões intelectuais.
O estudioso definiu eugenia como:
“O estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente”.
O intuito de Galton era identificar quem são os membros ideais da sociedade. Esses seriam incentivados a se reproduzirem visando o aperfeiçoamento dos genes das gerações futuras.
Para os eugenistas, alguns indivíduos eram indesejáveis na sociedade e deveriam ser impedidos de gerarem filhos. Os critérios de exclusão abarcavam condições socioeconômicas, fenotípicas, vícios e doenças físicas e mentais.
Segundo esses defensores eugenistas, prostitutas, deficientes, negros, pobres e alcoólatras deveriam ser extirpados da sociedade.
Galton acreditava que era preciso impedir a reprodução de “indesejáveis” para impedir uma “piora racial” na espécie humana.
Inspirado em Charles Darwin, Jean-Baptiste de Lamarck e outros pesquisadores influentes da época, o matemático aplicou conceitos da seleção natural ao ser humano.
A intenção desses pensadores era usar a eugenia para criar uma nação mais forte ao aperfeiçoar e fortalecer características físicas, psicológicas e comportamentais dos indivíduos, selecionando quem pode se reproduzir.
No seu livro, Galton propunha que “as forças cegas da seleção natural, como agente propulsor do progresso, devem ser substituídas por uma seleção consciente e os homens devem usar todos os conhecimentos adquiridos pelo estudo e o processo da evolução nos tempos passados, a fim de promover o progresso físico e moral no futuro”.
O argentino José Ingenieros publicou, em 1900, um texto, posteriormente divulgado como “La simulación en la lucha por la vida”. Neste texto incluem-se algumas considerações eugênicas:
“Por acaso, os homens do futuro, educando seus sentimentos dentro de uma moral que reflita os verdadeiros interesses da espécie, possam tender até uma medicina superior, seletiva; o cálculo sereno desvaneceria uma falsa educação sentimental, que contribui para a conservação dos degenerados, com sérios prejuízos para a espécie”.
A teoria eugênica ganhou adeptos ao redor do mundo. Em 1908, foi fundada a “Eugenics Society” em Londres, primeira organização a defender essas ideias de forma organizada e ostensiva. Um de seus líderes era Leonard Darwin (1850-1943), oitavo dos dez filhos de Charles Darwin.
Diversos países criaram sociedades eugênicas:
Sob o pretexto de melhoria genética, o conceito fortaleceu práticas de exclusão e segregação social.
O Brasil foi um dos primeiros países da América do Sul a criar um movimento eugenista organizado. No começo do século XX, o termo “eugenia” já aparecia em artigos e pesquisas médicas. Em 1918, a corrente se consolidou com a fundação da Sociedade Eugênica de São Paulo.
Na década de 1930, com a publicação do Boletim de Eugenia, o movimento ganhou ainda mais força no Brasil.
Um médico eugenista brasileiro defendeu a limpeza da linhagem brasileira de qualquer resquício de povos indígenas e negros. Renato Kehl, um dos fundadores da Sociedade Eugênica de São Paulo, escreveu dezenas de livros defendendo as práticas racistas.
Em seu livro “A Cura da Fealdade”, o médico defende abertamente a limpeza da linhagem brasileira e o embranquecimento da população.
As teorias eugênicas no Brasil se consolidaram com o intuito de embranquecer a população, o que hoje pode ser visto como uma mancha na história. Em 1820, com as primeiras regras restringindo o tráfico de escravos, o Brasil incentivou em massa a migração europeia.
Além de trazer mão de obra qualificada para o Brasil, engenheiros sociais desejavam embranquecer o país.
As imigrações portuguesa, alemã, italiana e japonesa foram incentivadas no século XIX. Outras políticas públicas foram feitas no Brasil motivadas pelas teorias eugenistas.
Entre 1853 e 1870, a então capital do Brasil, Rio de Janeiro, passou por uma reforma. O modelo de inspiração era a cidade de Paris, com largas avenidas arborizadas. Mas o centro do Rio era tomado por casarões antigos do período colonial.
As velhas estruturas abrigavam cortiços, casarões onde coabitavam muitas famílias de condição humilde.
Para os reformadores do Rio de Janeiro, a capital do país que desejava se modernizar não poderia ter seu centro tomado por pessoas tidas como “indesejáveis”. Motivados pelas teorias eugênicas, as autoridades do Rio de Janeiro expulsaram os moradores dos cortiços do centro e demoliram os casarões.
Sob um pretexto científico, a teoria eugenista lamentavelmente promoveu a exclusão de pessoas.
As ideias eugenistas influenciaram diversos movimentos no século XX e XXI. As principais consequências do movimento foram:
O Movimento Eugenista emprestou suas ideias ao Nazismo e fundamentou teorias de pureza racial.
Margaret Sanger pregava uma limpeza étnica da população dos Estados Unidos. Antes da Segunda Guerra Mundial, grupos eugenistas dos Estados Unidos promoviam feiras para eleger bons casais reprodutores.
Esses casais eram julgados conforme o seu biótipo, aparência e critérios que eram fundamentados em ideologias evolucionistas. Essas ideias estão profundamente arraigadas e ligadas à origem do abortismo contemporâneo.
Margaret Sanger dizia:
“Todo portador de debilidade mental é uma possível fonte de uma descendência defeituosa interminável; damos preferência à política de esterilização imediata para que se proíba completamente a procriação dos débeis mentais”. O Eixo da Civilização.
Uma das maiores mazelas da humanidade tem a eugenia em sua fundação. A Alemanha hitlerista desenvolveu teorias da superioridade da raça ariana a partir das ideias eugenistas de pensadores como Francis Galton e Margaret Sanger. Defenderam uma raça supostamente pura da qual o povo alemão descendia dos antigos povos germânicos.
No programa do Partido Nacional-Socialista Alemão, publicado em 1920, os nazistas revelavam sua intenção de segregar judeus da sociedade alemã. Em 1933, quando chegaram ao poder, emitiram cerca de 400 decretos contra o povo semita.
Em 1933, restringiram o acesso de judeus às escolas e universidades alemãs, depois limitaram o número de servidores públicos de origem judia. Em 1934, proibiram a entrada deles em espaços públicos como teatros.
Em 1935, foram publicadas as Leis de Nuremberg. Elas excluíram definitivamente os judeus da vida pública e proibiram que eles se casassem com arianos. Até que, em 1938, foram criados guetos para os povos semitas.
Em 18 de agosto de 1939, foi emitida uma circular do Ministério do Interior do Reich que obrigava médicos e enfermeiros a notificar crianças nascidas com deformidades. Elas eram tiradas de seus pais e recebiam injeções letais.
Depois foram criados os campos de concentração e os campos de extermínios de judeus e outros povos considerados indesejáveis aos nazistas. Como eram considerados inferiores, muitos prisioneiros foram vítimas de cruéis pesquisas científicas.
Richard Weaver afirma que “as ideias têm consequências”, e uma das consequências da eugenia foi o fomento ideológico que surgiu para os ideais nazistas.
Em 1953, após a Segunda Guerra Mundial, os crimes dos campos de concentração foram expostos. Isto não impediu que novos experimentos eugenistas surgissem.
O Estudo de Tuskegee foi uma pesquisa médico-científica feita no estado do Alabama, na cidade de Tuskegee. O local contava com uma grande proporção de pessoas negras e de condições socioeconômicas inferiores.
Na década de 50, alguns estados americanos praticavam a segregação racial, dividindo socialmente os espaços que negros e brancos deveriam habitar. As leis de Jim Crow sustentam juridicamente esta medida eugenista.
No estudo de Tuskegee, pesquisadores identificaram que a cidade tinha altos índices de pessoas com sífilis. Os estudiosos resolveram separar moradores de Tuskegee para uma amostragem de estudos, analisando o ciclo de desenvolvimento da doença.
O estudo buscava entender como a sífilis se desenvolvia na população negra local. Algumas das possíveis consequências da doença são problemas neurológicos ou cardíacos que podem levar à morte.
Durante a pesquisa, foi descoberto um antibiótico capaz de curar a doença. Segundo a ética médica, o correto seria aplicá-lo nas pessoas contaminadas e salvá-las. Os estudiosos, motivados pela pesquisa científica e aplicando ideias eugenistas, permitiram o desenvolvimento da doença.
Os médicos fingiam tratar os pacientes com injeções e outros procedimentos, quando na verdade permitiam o desenvolvimento de quadros graves da sífilis.
O Doutor Hélio Angotti Neto menciona esse caso em seu curso exclusivo da Brasil Paralelo, O Valor da Vida Humana, e afirma:
“Esse Estudo de Tuskegee traz para a Bioética a lição de que o conhecimento pelo conhecimento é imoral.
O conhecimento –– buscar o conhecimento da vida, da morte, da saúde, da doença — só vale se estiver promovendo imediatamente o bem a algum paciente, ao próximo, e seja submetido a princípios elevados e nobres. Tuskegee deixa, portanto, uma marca muito feia na história das pesquisas científicas”.
Em 1927, o estado da Virgínia aprovou leis que permitiam a esterilização de pessoas consideradas “indesejáveis”. Esse caso parou na Suprema Corte americana e ficou conhecido como caso Buck v. Bell.
A decisão contou com oito votos favoráveis contra apenas um que condenou as leis de esterilização no estado da Virgínia.
O juiz Oliver Wendell Holmes Jr resumiu as ideias do tribunal da época com a frase: “Três gerações de imbecis são suficientes”.
Alcoólatras, criminosos, imigrantes indesejáveis, afro-americanos foram esterilizados à força. Cerca de 70 mil pessoas sofreram o processo da Califórnia a Nova York. A aprovação na Virgínia pela Suprema Corte abriu precedentes para que mais 32 estados aprovassem leis eugenistas.
A percepção eugenista de inferioridade de grupos com base em questões raciais e fenotípicas é o mesmo incentivador da indústria do aborto nos Estados Unidos.
A maior instituição que promove o aborto no mundo é a Planned Parenthood. Ela surgiu em 1916 e teve entre seus fundadores a defensora da eugenia Margaret Sanger. A enfermeira defendia limpeza racial dos Estados Unidos a partir do controle populacional dos negros norte-americanos.
A primeira clínica da Planned Parenthood foi feita no Harlem, bairro de Nova York que era habitado majoritariamente por negros de baixa condição econômica.
Sanger simpatizava com o grupo supremacista branco Ku Klux Klan. Em 1926, ela chegou a palestrar para membros da instituição, em Nova Jersey.
Quando fundou as clínicas da Planned Parenthood, ela não poderia divulgar seus verdadeiros objetivos. Assim, a defesa do aborto era feita em prol “da liberdade de escolha da mulher”.
Em seu texto “A Ética e o Controle dos Nascimentos”, Sanger afirma:
“O controle dos nascimentos consiste, nem mais nem menos, na eliminação das pessoas inadequadas”.
Nesse mesmo texto e no “O controle dos nascimentos e a nova raça” a escritora defende abertamente seu desejo de eliminar indivíduos considerados “inadequados” para reprodução.
Existem desdobramentos modernos para o aborto que estão associados às práticas eugênicas.
Segundo dados apresentados pela CBS em uma reportagem, a Islândia é um país que atualmente aborta 100% dos bebês com síndrome de Down.
Em outros países a tendência se repete: no Reino Unido, a porcentagem chega a 90%. Na França são 77% e nos Estados Unidos 67%.
Bebês com síndrome de Down são considerados indesejáveis e são mortos no procedimento abortivo. Pessoas que têm a síndrome possuem uma expectativa de vida de até 60 anos.
Na contemporaneidade, as ideias eugenistas ainda pautam políticas de saúde pública.
Na Holanda, pais podem autorizar a eutanásia de filhos nascidos com doenças graves. Essa é uma política conhecida como Protocolo Groningen. Se a doença for grave e causar um sofrimento que pode ser considerado irreversível ou insuportável, os pais podem autorizar a morte da criança.
Até hoje existem culturas indígenas que enterram crianças vivas que nascem com alguma deformidade ou até gêmeos.
Durante a Segunda Guerra Mundial, um psiquiatra viveu os horrores dos campos de concentração e sobreviveu. A experiência levou Viktor Frankl a refletir sobre o valor da vida humana:
“Não foram apenas alguns ministérios de Berlim que inventaram as câmaras de gás de Maidanek, Auschwitz, Treblinka: elas foram preparadas nos escritórios e salas de aula de cientistas e filósofos niilistas, entre os quais se contavam e contam alguns pensadores anglo-saxônicos laureados com o Prêmio Nobel. É que, se a vida humana não passa do insignificante produto acidental de umas moléculas de proteína, pouco importa que um psicopata seja eliminado como inútil e que ao psicopata se acrescentem mais uns quantos povos inferiores: tudo isto não é senão raciocínio lógico e consequente”.
Dentro do campo da bioética há várias “escolas”. Uma delas é a Utilitarista. De acordo com essa escola, o correto não é exatamente o ato que segue princípios, mas o ato que causa ao maior número de pessoas o maior bem possível, ou a maior satisfação, ou o maior prazer ou o maior benefício cumulativo.
Pensadores de caráter mais materialista acabam buscando o utilitarismo e centrando a utilidade em uma concepção de realização pessoal, o que abre margem para subjetividades.
Alguns utilitaristas assumiram instâncias mais radicais, como George Bernard Shaw, que falava que uma vida vale o quanto ela retribui à sociedade e que é preciso avaliar se essa vida realmente vale a pena.
Caso não valesse a pena, o escritor defendia ideias para eliminar essas vidas. Alguns dos métodos propostos pelo autor envolvem câmaras de gás.
George Bernard Shaw afirmou que somente uma religião eugênica poderia salvar a civilização.
Opositor de Bernard Shaw, o filósofo e polemista Gilbert Keith Chesterton escreveu um livro para abordar os problemas da eugenia.
Entre 1910 e 1922, G.K. Chesterton escreveu e publicou o livro “Eugenia e outros males”. Para o escritor, a eugenia e o aborto fundamentam os seus benefícios em privar toda uma classe de seres humanos de sua humanidade.
No caso da eugenia, eram os “inadaptados”, o que em geral queria dizer: os pobres, os fracos ou, simplesmente, os membros de determinada etnia que tinham filhos demais.
No caso do aborto, alguém se beneficiaria da eliminação do mais fraco e indefeso dos seres humanos: o nascituro.
A eugenia e o aborto têm relação com a tirania de um grupo que decide quem poderá viver e quem deverá morrer. Sob a visão da eugenia, os mais vulneráveis da sociedade não encontrariam compaixão e ajuda, eles encontrariam o bisturi do cirurgião.
Como Chesterton brincou, não haveria simpatia pelo personagem de Tiny Tim, o menino aleijado da família Cratchit em “Um Conto de Natal”, de Charles Dickens.
“O eugenista, pelo que sei, consideraria a mera existência de Tiny Tim como uma razão suficiente para massacrar toda a família Cratchit”.
No coração do movimento de eugenia, acreditava Chesterton, estava uma visão totalmente materialista da pessoa humana: o homem como rato de laboratório.
O movimento eugênico, como Chesterton previu, tornou-se uma história miserável de negação dos ideais democráticos para servir a uma visão utópica. “Assim, a tirania deu apenas um passo para alcançar os lugares secretos e sagrados da liberdade pessoal”, escreveu ele, “onde nenhum homem com sanidade jamais sonhou em vê-la”.
C. S. Lewis, professor de Oxford e autor de As Crônicas de Nárnia, também observou esses desenvolvimentos com horror. Como Chesterton, ele advertiu sobre o cientista desvinculado das restrições da moralidade ou religião tradicional.
“Os modeladores de homens da nova era estarão armados com os poderes de um estado onicompetente e uma técnica científica irresistível”, escreveu Lewis em A Abolição do Homem.
Em tal época, ele previu que a suposta conquista do homem sobre a natureza não levaria à sua libertação — muito pelo contrário.
“Pois o poder do homem de fazer a si mesmo o que quer significa, como vimos, o poder de alguns homens de fazer a outros o que quiserem”.
É o que acontece no caso do aborto, que é usado para eliminar crianças com características indesejáveis. Na fundação da Planned Parenthood, não existiam exames pré-natais. A medicina hoje consegue identificar doenças ainda na gestação.
O movimento eugenista é em sua essência um movimento progressista. Sua visão baseia-se na ideia de desenvolvimento para a sociedade e para o futuro. Com o intuito de buscar uma suposta perfeição humana, o eugenismo ocorre à custa da dignidade e igualdade humanas, deixando de lado o verdadeiro valor da vida.
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